Data de publicação
2009
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Vice-rei da Índia e 1º conde de Vila da Horta e Santa Cruz (1581-1584).
Nascido em 1530, foi o quarto filho de D. João Mascarenhas, 2º senhor de Lavre e Estepa, alcaide-mor de Montemor-o-Novo e comendador de Mértola, na Ordem de Cristo, e de D. Margarida Coutinho, terceira filha de D. Vasco Coutinho, 1º conde de Redondo. O seu avô D. Francisco Coutinho, 3º conde daquela casa, foi vice-rei da Índia. D. Francisco Mascarenhas, nascido em casa de elevada estirpe nobiliárquica e com tradição de serviços à Coroa, teve por seu tio ainda, outro vice-rei da Índia, D. Pedro Mascarenhas. De entre os seus vários irmãos que teve destacam-se D. Nuno Mascarenhas falecido em Arzila, a sua irmã mais nova, D. Catarina da Silva que casou com D. Cristóvão de Moura, 1º marquês de Castelo Rodrigo, bastante próximo de D. Filipe I de Portugal, D. Leonor Mascarenhas que se casou com o 4º barão do Alvito, D. João Lobo da Silveira, e ainda o seu irmão mais novo, D. Diogo Mascarenhas, falecido na Índia. Casado primeiro com D. Leonor de Ataíde, filha do 10º senhor do morgado de Oliveira, Martim Afonso de Oliveira, da qual não teve filhos, voltou a consorciar-se com D. Joana de Vilhena, união pela qual garantiu a sucessão da sua casa titular. Oriundo de linhagem prestigiada e associada à causa filipina por via do marquês de Castelo Rodrigo, D. Francisco Mascarenhas, exerceu, durante os reinados do Piedoso e do Desejado, importantes cargos, como o de capitão dos ginetes e o de capitão dos cavaleiros, escudeiros e criados da Casa Real. Igualmente membro do Conselho Real, serviu durante largos anos na Índia para onde partiu pela primeira vez em 1554 na armada em que seguia o seu tio, D. Pedro Mascarenhas como vice-rei, tendo sido nomeado em 1562, capitão do mar e governador de Chaul, e em seguida indigitado para governador de Sofala, em 1564, após participação no socorro de Cananor daquele ano. Em 1567, participou na expedição de Mangalor. Durante o primeiro vice-reinado de D. Luís de Ataíde, resistiu com 1600 homens ao cerco montado pelo sultão de Ahmadnagar, no âmbito da crise de 1565-75. Regressado ao Reino, em 1578, acompanhou D. Sebastião, na jornada de Alcácer Quibir, estando presente na fatídica reunião anterior à batalha, ao lado do duque de Aveiro e do conde do Vimioso. Aprisionado pelos muçulmanos, logrou alcançar a liberdade, regressando de novo ao Reino, onde defendeu acerrimamente, durante o curto reinado do cardeal-rei, os direitos de D. Filipe I à coroa portuguesa. Nomeado vice-rei por carta de 22 de Fevereiro de 1581, numa fase em que ainda se julgava que iria suceder ao segundo governo de D. Luís de Ataíde na Índia, entre 1578 e 1581, foi encarregado pelo Prudente de o fazer jurar como rei em todo o Estado da Índia, razão pela qual o soberano lhe concedeu o título de conde de Vila da Horta que apenas deveria passar a utilizar assim que chegasse à Índia, bem como inúmeras mercês e tenças que na altura recebeu para si e para a sua família. Além de levar uma carta régia que transformava o 3º conde de Atouguia em marquês de Santarém foi também portador de alvarás régios assinados em branco que deveria utilizar para aliciar os capitães e fidalgos da Índia, caso estes não aceitassem pacificamente a União Dinástica. Esta viria a ser pacífica, mas caso tal não tivesse acontecido, D. Francisco Mascarenhas tinha instruções para invernar em Moçambique e esperar por ordens directas de D. Filipe I. Esta primeira nomeação de D. Filipe I para um vice-rei da Índia foi também acompanhada das nomeações para as capitanias mais importantes.
Partindo de Lisboa a 11 de Abril de 1581, aportou em Moçambique a 18 de Agosto, ali fazendo jurar D. Filipe I como rei de Portugal, passando de imediato a ostentar o título condal. A 24 de Setembro entrou em Goa, onde constatou que o governador Fernão Teles de Meneses já havia feito jurar D. Filipe I por rei, facto que o desanimou, pois tinha sido o encargo dessa missão, uma das razões primordiais da sua nomeação para vice-rei, a par da anterior carreira na Índia. A sua primeira decisão governativa, após reunião em Conselho, consubstanciou-se no tradicional despacho das armadas. Começou por despachar Matias de Albuquerque com duas galés, vinte fustas e 700 homens para os mares do Malabar. Já para a armada do Sul, e após ter despachado embaixador para a corte mogol, destacou Diogo Lopes Coutinho. Na armada de Matias de Albuquerque, seguiram André Furtado de Mendonça, e ainda D. Jerónimo de Azevedo, além de D. Gil Eanes Mascarenhas, fidalgo de destaque, e de Francisco Fernandes. Esta armada que se dedicou a destruir vários portos de piratas malabares, semeou a destruição no Malabar, apresando vários navios inimigos e causando sérios danos aos reinos da região.
Pelos inícios de 1582, a armada de Diogo Lopes Coutinho causava grande dano em torno de Surrate, razão pela qual Martim Afonso de Melo, capitão de Damão, necessitou do seu auxílio e de outros enviados de quase todas as partes da Índia, nomeadamente o envio de Fernão de Miranda pelo vice-rei, ou ainda o auxílio de D. Gil Eanes, para quebrar o cerco mogol capitaneado pelo general inimigo, Calichan das fontes portuguesas. Apesar do cerco ter sido vencido pelos Portugueses, este esteve a ponto de ceder devido a desentendimentos entre o capitão e os soldados. Aproveitando o cerco de Damão, o rei de Sarceta, nas imediações de Damão, tradicional aliado dos Portugueses, revoltou-se. Apenas a expedição de Martim Afonso de Melo, Fernão de Miranda e D. Duarte de Eça, já após o fim do cerco, pôde conter aquela ameaça. Entretanto, chegavam notícias de nova ameaça turca a Mascate, que no ano anterior tinha sido saqueada. Estas não se confirmaram, vindo mais tarde a saber-se que a armada turca se dirigia para Moçambique, razão pela qual D. Francisco Mascarenhas despachou uma armada de socorro para a região cujo capitão foi Fernão Boto Machado. No entanto, já antes por ordem régia, tinha nomeado o seu sobrinho, D. Jerónimo Mascarenhas para capitanear a armada do Golfo Pérsico que deveria apoiar D. Gonçalo de Meneses, capitão de Ormuz, no castigo a infligir a povos locais colaborantes com os Turcos. Pouco depois o xeque de Lara, rei das imediações de Ormuz, procurava sitiar a fortaleza de Xamel, possessão do rei de Ormuz, acabando por ser derrotado, já no Verão, naquela praça. Após o final do cerco de Damão que consumiu a total atenção do vice-rei, este de imediato enviou socorros, nos quais seguia D. Jerónimo de Azevedo, para o Ceilão onde o Raju das fontes portugueses, rei de Sitawaka, que então colocava novo cerco a Colombo, viria a ser mal sucedido. Mas o recheado ano de 1582 não terminaria sem novo cerco do Achém a Malaca, desbaratado pelo capitão da fortaleza D. João da Gama e pela acção de Nuno Monteiro que em batalha naval conseguiu evitar o incêndio da armada portuguesa. Derrotado em Malaca, o sultão do Achém, que tinha contado com novo apoio turco, procurou cercar Johor, sendo enviado àquele soberano um socorro de doze baixéis. Na fase final do ano, partia para Goa um embaixador de Akbar, enquanto Fernão de Miranda, findo o cerco de Damão, com uma armada de vinte navios se dedicava a assaltar os mares de Surrate, na companhia de D. Francisco da Gama. No entanto, e devido à má partilha do saque obtido naquela acção, os tripulantes daquela armada protagonizaram distúrbios em Damão. Prosseguindo a acção de Matias de Albuquerque no Malabar, com grave dano para o Samorim, este decidiu-se a pedir as pazes, embora acabasse por ser punido por Matias em virtude de não ter cumprido as pazes. No final do ano, com a chegada da armada do Reino que havia combatido Ingleses pelo caminho, Matias de Albuquerque era nomeado para a capitania de Ormuz, enquanto D. Gil Eanes Mascarenhas ficava, em sua substituição, como capitão-mor do Malabar.
O ano de 1583 principiou com nova vitória sobre os piratas malabares, sendo a cidade de Tavar pilhada. No outro extremo da Ásia, o supracitado capitão de Malaca não tinha enviado socorro ao capitão de Tidore, Diogo de Azambuja, devido ao cerco do ano anterior a Malaca, razão pela qual este, após ter jurado obediência ao Prudente, decidiu solicitar auxílio ao governador das Filipinas, enviando D. João Ronquilho a Manila. No Malabar, prosseguia a luta contra os piratas com a destruição de Cunhale e com o rei de Chale a oferecer vassalagem e tributo aos Portugueses, devido à acção de D. Gil Eanes. Todavia, em Barcelor, os habitantes insatisfeitos com o controlo português da alfândega da cidade, pelo menos desde o ano anterior, procuraram rebelar-se, acabando D. Gil Eanes por defender a praça neste ano. O rei de Tolar que havia apoiado esta rebelião, foi punido, segundo ordem do vice-rei, por André Furtado de Mendonça. Mas o acontecimento que mais marcaria o ano seria uma revolta em Salsete dos gentios que destruíram várias igrejas e mataram quatro jesuítas. O vice-rei encarregou o capitão de Rachol, Gomes Eanes de Figueiredo, de punir os insubmissos duramente, acabando muitos deles por fugirem para os territórios do sultão de Bijapur. Por fim, na armada vinda do Reino no final deste ano, chegava à Índia, o novo arcebispo de Goa, Vicente de Fonseca, sucessor de Henrique de Távora.
No último ano do seu governo, D. Francisco Mascarenhas empenhou-se em tentar aproveitar contextos locais para adquirir novas conquistas. Assim, sucedeu no Guzerate com uma revolta do soberano deposto por Akbar, à qual o vice-rei procurou acudir, sem sucesso, na esperança de conquistar Surrate aos mogores. Em Bijapur, a guerra pela sucessão do sultanato conhecia novo desenvolvimento, mas o pretendente apoiado pelos Portugueses, acabou por ser morto pelos seus inimigos, ficando o vice-rei sem poder de intervenção naquele sultanato. Ainda assim, o Samorim de Calecute pedia as pazes definitivas, devido à exaustão da guerra no Malabar, a cargo de D. Gil Eanes que, depois foi nomeado para punir um vassalo do sultão de Bijapur, acabando por falecer em combate. O rei de Cochim também desistia dos seus intentos de controlar a alfândega da cidade, a qual trespassou para o rei de Portugal. A 25 de Novembro D. Francisco Mascarenhas entregou o governo ao seu sucessor D. Duarte de Meneses, partindo em seguida para o Reino.
No entanto, a prestigiada carreira de D. Francisco Mascarenhas não findaria em 1584. Uma vez regressado ao Reino e findo o governo do arquiduque Alberto de Áustria em Portugal em 1593, foi nomeado por D. Filipe I como um dos cinco governadores do Reino, recebendo diversas mercês nos anos seguintes. Assim, em 1596, foi nomeado capitão-donatário das ilhas das Flores e Corvo, e Santo Antão (Cabo Verde) a 17 de Setembro, como recompensa do seu bom governo da Índia e por ter perdido as capitanias de Faial e do Pico pela demanda dos Corte-Reais, donatários do Faial. Ainda em 1593, o seu título de conde de Vila da Horta foi-lhe mudado para conde de Santa Cruz a 3 de Outubro, como referência à vila desse nome na ilha das Flores, da qual havia sido donatário. Faleceu em 1608.
O seu governo de três anos e dois meses, fortemente associado ao cerco de Damão e de Malaca e, sobretudo ao combate da pirataria malabar, acabou por seguir um curso diferente daquele que se esperava. D. Francisco acabou por não ser o agente que tencionava ser do juramento de D. Filipe I como rei de Portugal. Ainda assim, o seu governo não ficou mal visto, nem a sua relação com o monarca afectada por aquele acontecimento.
Bibliografia:
COUTO, Diogo do, Da Ásia, X, i, 8-9 e livros ii-v, Lisboa, Livraria San Carlos, 1974. SOUSA, Manuel de Faria e, Ásia Portuguesa, tradução de Maria Vitória Garcia Santos Ferreira, vol. V, Parte 1, caps. I-II, Porto, Livraria Civilização, 1947. ZÚQUETE, Afonso, Tratado de Todos os Vice-Reis e Governadores da Índia, Lisboa, Editorial Enciclopédia, 1962.
Nascido em 1530, foi o quarto filho de D. João Mascarenhas, 2º senhor de Lavre e Estepa, alcaide-mor de Montemor-o-Novo e comendador de Mértola, na Ordem de Cristo, e de D. Margarida Coutinho, terceira filha de D. Vasco Coutinho, 1º conde de Redondo. O seu avô D. Francisco Coutinho, 3º conde daquela casa, foi vice-rei da Índia. D. Francisco Mascarenhas, nascido em casa de elevada estirpe nobiliárquica e com tradição de serviços à Coroa, teve por seu tio ainda, outro vice-rei da Índia, D. Pedro Mascarenhas. De entre os seus vários irmãos que teve destacam-se D. Nuno Mascarenhas falecido em Arzila, a sua irmã mais nova, D. Catarina da Silva que casou com D. Cristóvão de Moura, 1º marquês de Castelo Rodrigo, bastante próximo de D. Filipe I de Portugal, D. Leonor Mascarenhas que se casou com o 4º barão do Alvito, D. João Lobo da Silveira, e ainda o seu irmão mais novo, D. Diogo Mascarenhas, falecido na Índia. Casado primeiro com D. Leonor de Ataíde, filha do 10º senhor do morgado de Oliveira, Martim Afonso de Oliveira, da qual não teve filhos, voltou a consorciar-se com D. Joana de Vilhena, união pela qual garantiu a sucessão da sua casa titular. Oriundo de linhagem prestigiada e associada à causa filipina por via do marquês de Castelo Rodrigo, D. Francisco Mascarenhas, exerceu, durante os reinados do Piedoso e do Desejado, importantes cargos, como o de capitão dos ginetes e o de capitão dos cavaleiros, escudeiros e criados da Casa Real. Igualmente membro do Conselho Real, serviu durante largos anos na Índia para onde partiu pela primeira vez em 1554 na armada em que seguia o seu tio, D. Pedro Mascarenhas como vice-rei, tendo sido nomeado em 1562, capitão do mar e governador de Chaul, e em seguida indigitado para governador de Sofala, em 1564, após participação no socorro de Cananor daquele ano. Em 1567, participou na expedição de Mangalor. Durante o primeiro vice-reinado de D. Luís de Ataíde, resistiu com 1600 homens ao cerco montado pelo sultão de Ahmadnagar, no âmbito da crise de 1565-75. Regressado ao Reino, em 1578, acompanhou D. Sebastião, na jornada de Alcácer Quibir, estando presente na fatídica reunião anterior à batalha, ao lado do duque de Aveiro e do conde do Vimioso. Aprisionado pelos muçulmanos, logrou alcançar a liberdade, regressando de novo ao Reino, onde defendeu acerrimamente, durante o curto reinado do cardeal-rei, os direitos de D. Filipe I à coroa portuguesa. Nomeado vice-rei por carta de 22 de Fevereiro de 1581, numa fase em que ainda se julgava que iria suceder ao segundo governo de D. Luís de Ataíde na Índia, entre 1578 e 1581, foi encarregado pelo Prudente de o fazer jurar como rei em todo o Estado da Índia, razão pela qual o soberano lhe concedeu o título de conde de Vila da Horta que apenas deveria passar a utilizar assim que chegasse à Índia, bem como inúmeras mercês e tenças que na altura recebeu para si e para a sua família. Além de levar uma carta régia que transformava o 3º conde de Atouguia em marquês de Santarém foi também portador de alvarás régios assinados em branco que deveria utilizar para aliciar os capitães e fidalgos da Índia, caso estes não aceitassem pacificamente a União Dinástica. Esta viria a ser pacífica, mas caso tal não tivesse acontecido, D. Francisco Mascarenhas tinha instruções para invernar em Moçambique e esperar por ordens directas de D. Filipe I. Esta primeira nomeação de D. Filipe I para um vice-rei da Índia foi também acompanhada das nomeações para as capitanias mais importantes.
Partindo de Lisboa a 11 de Abril de 1581, aportou em Moçambique a 18 de Agosto, ali fazendo jurar D. Filipe I como rei de Portugal, passando de imediato a ostentar o título condal. A 24 de Setembro entrou em Goa, onde constatou que o governador Fernão Teles de Meneses já havia feito jurar D. Filipe I por rei, facto que o desanimou, pois tinha sido o encargo dessa missão, uma das razões primordiais da sua nomeação para vice-rei, a par da anterior carreira na Índia. A sua primeira decisão governativa, após reunião em Conselho, consubstanciou-se no tradicional despacho das armadas. Começou por despachar Matias de Albuquerque com duas galés, vinte fustas e 700 homens para os mares do Malabar. Já para a armada do Sul, e após ter despachado embaixador para a corte mogol, destacou Diogo Lopes Coutinho. Na armada de Matias de Albuquerque, seguiram André Furtado de Mendonça, e ainda D. Jerónimo de Azevedo, além de D. Gil Eanes Mascarenhas, fidalgo de destaque, e de Francisco Fernandes. Esta armada que se dedicou a destruir vários portos de piratas malabares, semeou a destruição no Malabar, apresando vários navios inimigos e causando sérios danos aos reinos da região.
Pelos inícios de 1582, a armada de Diogo Lopes Coutinho causava grande dano em torno de Surrate, razão pela qual Martim Afonso de Melo, capitão de Damão, necessitou do seu auxílio e de outros enviados de quase todas as partes da Índia, nomeadamente o envio de Fernão de Miranda pelo vice-rei, ou ainda o auxílio de D. Gil Eanes, para quebrar o cerco mogol capitaneado pelo general inimigo, Calichan das fontes portuguesas. Apesar do cerco ter sido vencido pelos Portugueses, este esteve a ponto de ceder devido a desentendimentos entre o capitão e os soldados. Aproveitando o cerco de Damão, o rei de Sarceta, nas imediações de Damão, tradicional aliado dos Portugueses, revoltou-se. Apenas a expedição de Martim Afonso de Melo, Fernão de Miranda e D. Duarte de Eça, já após o fim do cerco, pôde conter aquela ameaça. Entretanto, chegavam notícias de nova ameaça turca a Mascate, que no ano anterior tinha sido saqueada. Estas não se confirmaram, vindo mais tarde a saber-se que a armada turca se dirigia para Moçambique, razão pela qual D. Francisco Mascarenhas despachou uma armada de socorro para a região cujo capitão foi Fernão Boto Machado. No entanto, já antes por ordem régia, tinha nomeado o seu sobrinho, D. Jerónimo Mascarenhas para capitanear a armada do Golfo Pérsico que deveria apoiar D. Gonçalo de Meneses, capitão de Ormuz, no castigo a infligir a povos locais colaborantes com os Turcos. Pouco depois o xeque de Lara, rei das imediações de Ormuz, procurava sitiar a fortaleza de Xamel, possessão do rei de Ormuz, acabando por ser derrotado, já no Verão, naquela praça. Após o final do cerco de Damão que consumiu a total atenção do vice-rei, este de imediato enviou socorros, nos quais seguia D. Jerónimo de Azevedo, para o Ceilão onde o Raju das fontes portugueses, rei de Sitawaka, que então colocava novo cerco a Colombo, viria a ser mal sucedido. Mas o recheado ano de 1582 não terminaria sem novo cerco do Achém a Malaca, desbaratado pelo capitão da fortaleza D. João da Gama e pela acção de Nuno Monteiro que em batalha naval conseguiu evitar o incêndio da armada portuguesa. Derrotado em Malaca, o sultão do Achém, que tinha contado com novo apoio turco, procurou cercar Johor, sendo enviado àquele soberano um socorro de doze baixéis. Na fase final do ano, partia para Goa um embaixador de Akbar, enquanto Fernão de Miranda, findo o cerco de Damão, com uma armada de vinte navios se dedicava a assaltar os mares de Surrate, na companhia de D. Francisco da Gama. No entanto, e devido à má partilha do saque obtido naquela acção, os tripulantes daquela armada protagonizaram distúrbios em Damão. Prosseguindo a acção de Matias de Albuquerque no Malabar, com grave dano para o Samorim, este decidiu-se a pedir as pazes, embora acabasse por ser punido por Matias em virtude de não ter cumprido as pazes. No final do ano, com a chegada da armada do Reino que havia combatido Ingleses pelo caminho, Matias de Albuquerque era nomeado para a capitania de Ormuz, enquanto D. Gil Eanes Mascarenhas ficava, em sua substituição, como capitão-mor do Malabar.
O ano de 1583 principiou com nova vitória sobre os piratas malabares, sendo a cidade de Tavar pilhada. No outro extremo da Ásia, o supracitado capitão de Malaca não tinha enviado socorro ao capitão de Tidore, Diogo de Azambuja, devido ao cerco do ano anterior a Malaca, razão pela qual este, após ter jurado obediência ao Prudente, decidiu solicitar auxílio ao governador das Filipinas, enviando D. João Ronquilho a Manila. No Malabar, prosseguia a luta contra os piratas com a destruição de Cunhale e com o rei de Chale a oferecer vassalagem e tributo aos Portugueses, devido à acção de D. Gil Eanes. Todavia, em Barcelor, os habitantes insatisfeitos com o controlo português da alfândega da cidade, pelo menos desde o ano anterior, procuraram rebelar-se, acabando D. Gil Eanes por defender a praça neste ano. O rei de Tolar que havia apoiado esta rebelião, foi punido, segundo ordem do vice-rei, por André Furtado de Mendonça. Mas o acontecimento que mais marcaria o ano seria uma revolta em Salsete dos gentios que destruíram várias igrejas e mataram quatro jesuítas. O vice-rei encarregou o capitão de Rachol, Gomes Eanes de Figueiredo, de punir os insubmissos duramente, acabando muitos deles por fugirem para os territórios do sultão de Bijapur. Por fim, na armada vinda do Reino no final deste ano, chegava à Índia, o novo arcebispo de Goa, Vicente de Fonseca, sucessor de Henrique de Távora.
No último ano do seu governo, D. Francisco Mascarenhas empenhou-se em tentar aproveitar contextos locais para adquirir novas conquistas. Assim, sucedeu no Guzerate com uma revolta do soberano deposto por Akbar, à qual o vice-rei procurou acudir, sem sucesso, na esperança de conquistar Surrate aos mogores. Em Bijapur, a guerra pela sucessão do sultanato conhecia novo desenvolvimento, mas o pretendente apoiado pelos Portugueses, acabou por ser morto pelos seus inimigos, ficando o vice-rei sem poder de intervenção naquele sultanato. Ainda assim, o Samorim de Calecute pedia as pazes definitivas, devido à exaustão da guerra no Malabar, a cargo de D. Gil Eanes que, depois foi nomeado para punir um vassalo do sultão de Bijapur, acabando por falecer em combate. O rei de Cochim também desistia dos seus intentos de controlar a alfândega da cidade, a qual trespassou para o rei de Portugal. A 25 de Novembro D. Francisco Mascarenhas entregou o governo ao seu sucessor D. Duarte de Meneses, partindo em seguida para o Reino.
No entanto, a prestigiada carreira de D. Francisco Mascarenhas não findaria em 1584. Uma vez regressado ao Reino e findo o governo do arquiduque Alberto de Áustria em Portugal em 1593, foi nomeado por D. Filipe I como um dos cinco governadores do Reino, recebendo diversas mercês nos anos seguintes. Assim, em 1596, foi nomeado capitão-donatário das ilhas das Flores e Corvo, e Santo Antão (Cabo Verde) a 17 de Setembro, como recompensa do seu bom governo da Índia e por ter perdido as capitanias de Faial e do Pico pela demanda dos Corte-Reais, donatários do Faial. Ainda em 1593, o seu título de conde de Vila da Horta foi-lhe mudado para conde de Santa Cruz a 3 de Outubro, como referência à vila desse nome na ilha das Flores, da qual havia sido donatário. Faleceu em 1608.
O seu governo de três anos e dois meses, fortemente associado ao cerco de Damão e de Malaca e, sobretudo ao combate da pirataria malabar, acabou por seguir um curso diferente daquele que se esperava. D. Francisco acabou por não ser o agente que tencionava ser do juramento de D. Filipe I como rei de Portugal. Ainda assim, o seu governo não ficou mal visto, nem a sua relação com o monarca afectada por aquele acontecimento.
Bibliografia:
COUTO, Diogo do, Da Ásia, X, i, 8-9 e livros ii-v, Lisboa, Livraria San Carlos, 1974. SOUSA, Manuel de Faria e, Ásia Portuguesa, tradução de Maria Vitória Garcia Santos Ferreira, vol. V, Parte 1, caps. I-II, Porto, Livraria Civilização, 1947. ZÚQUETE, Afonso, Tratado de Todos os Vice-Reis e Governadores da Índia, Lisboa, Editorial Enciclopédia, 1962.