Data de publicação
2009
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Termo que serve para designar a planta da família das Teáceas, as folhas e rebentos processados, a infusão e, ainda, a reunião social onde a bebida é consumida. Por arrasto, a palavra acabou por designar infusões feitas com outras plantas já consumidas na Europa antes da sua chegada. Dos outros estimulantes extra-europeus, o chá foi o que demorou mais tempo a globalizar-se. Durante mais de um milénio (séculos VI-XVII), ficou circunscrito ao mundo sínico.

O chá é feito a partir das folhas e rebentos da Camellia sinensis (L.) Kuntze. Foi da China que a cultura se expandiu para países de sua influência, como a Coreia e o Japão. E por aí permaneceu o seu cultivo até ao século XIX, apesar da transplantação da planta para jardins botânicos europeus após 1650. Até ao século XIX os europeus desconheceram as técnicas de transformação, reveladas mediante o recrutamento de técnicos chineses. Os portugueses foram os pioneiros em 1816, sendo seguidos por ingleses e holandeses. Na primeira metade de Oitocentos o cultivo do chazeiro disseminou-se e o incremento da produção satisfez a crescente procura mundial, embarateceu o chá e aumentou os consumidores, dentro de um processo que a revolução dos transporte e a globalização facilitaram.

As técnicas de transformação existentes reflectem a evolução do seu consumo na China. As folhas e rebentos foram consumidos como vegetal e só depois como infusão. Os chás destrinçam-se pela fermentação usada, existindo cinco tipos. Existem ainda variantes como o macha japonês, os chás aromatizados e os prensados.

História: C.1500, o seu consumo adquirira uma forma tipificada na China e no Japão, sendo um estimulante das civilizações sínicas. Curiosamente, desconhece-se qualquer menção ao chá em fontes lusas antes de 1548. A primeira referência deve-se a S. Francisco Xavier, sem empregar o termo, mas "chá" só surgiu impresso em 1565.

Tal foi surpreendente, dado os portugueses terem tomado conhecimento da bebida em Malaca em 1511. Para isso contribuiu o facto do paladar europeu associar o seu gosto amargo a uma mezinha, tanto mais que se habituaram ao doce com a vulgarização do açúcar. A bebida nunca captou o gosto português, apesar de a beberem. No Japão, contudo, houve maior interacção, suspeitando-se que Sen Rikyû se inspirou na liturgia católica para codificar o chanoyu.

O consumo do chá na Europa começa em 1650, mas o verdadeiro arranque data de 1720. Até lá bebeu-se mais chá verde e macha, o que o ligou a uma bebida exótica e medicinal de preço elevado. Um factor de disseminação foi o aparecimento de locais públicos de sociabilização ligados a uma burguesia emergente. Em 1720 deu-se a revolução no consumo europeu com a substituição dos chás verdes pelos fermentados, mais baratos. A East India Company conduziu a mudança, aumentou a importação de chá chinês e o seu embaratecimento criou mais consumidores, que bebiam "chá preto" ao gosto europeu.

Portugal ficou à margem por falta de locais públicos de sociabilização e por os portugueses preferirem estimulantes como o álcool e o tabaco. O papel difusor de D. Catarina de Bragança é sobreavaliado. Embora o tenha consumido, o chá era bebido anteriormente na Inglaterra. A rainha incentivou a moda, mas não criou o hábito de beber chá à tarde, costume introduzido pela duquesa de Bedford. Durante muito tempo o chá ficou associado a mezinhas, o que explica o favor que o chá verde teve em Portugal até tarde.

Sem grande consumo interno, Portugal apostou na reexportação para a Europa. Para isso contava com Macau, que aliás serviu de entreposto para os holandeses adquirirem chá chinês. Como o chá era monopólio das companhias comerciais europeias, a Inglaterra, França e Holanda ficaram vedadas e Lisboa só abastecia livremente o Mediterrâneo. Quando havia quebra de ligações com a China devido a guerras europeias, Portugal aproveitou e foi usado por terceiros para traficar com Macau em busca de chá. Mau grado o seu papel na disseminação do conhecimento do chá, o seu consumo em Portugal nunca disparou. Apenas com a sua introdução no Brasil em 1816 como cultura de substituição, deu Portugal os primeiros passos para vulgarizar o seu consumo. Não deu resultado devido à independência brasileira, mas abriu o caminho à exploração comercial da planta primeiro nos Açores e depois em Moçambique.

Fracassadas as tentativas de introduzir a sua cultura em Portugal continental, a planta veio a ser introduzida com sucesso em São Miguel por acção da Sociedade Promotora da Agricultura Micaelense em 1874, no seguimento da crise induzida pelo decréscimo da exportação de laranjas para a Inglaterra. Em 1875, foram contratados dois técnicos chineses para ensinar a arte de transformação e na década de 1880 os chazeiros começaram a dar o seu fruto. Mercê das condições naturais, clima ameno e forte pluviosidade, a produção micaelense foi crescendo, com crises intermédias provocadas pelas duas guerras mundiais, até à segunda metade do século XX. Então, a concorrência do chá moçambicano no mercado português ditou, em larga medida, a diminuição da produção e, consequentemente, da área cultiva, com a sua conversão em pastos. Actualmente, as plantações ocupam uma área reduzida e a produção é consumida maioritariamente no arquipélago (80%) e no "mercado da saudade", a diáspora açoreana no Novo Mundo.

Bibliografia: CUNHA, João Teles e, "Chá - A sociabilização da bebida em Portugal: séculos XVI-XVIII", in Aquém e Além da Taprobama. Estudos luso-orientais à memória de Jean Aubin e Denys Lombard, editados Luís Filipe F. R. Thomaz, Lisboa, CHAM, 2002. Idem, "A via do chá - cultura material e artefactos do Oriente ao Ocidente (séculos III a XVIII), in O Chá da China. Uma colecção particular, Lisboa, CCCM, 2005. ROSA, Paulo, Chá uma bebida da China, Mirandela, João Azevedo Editor, 2004.