Data de publicação
2009
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Quando um navio singra em rumo constante, diz-se que segue uma linha loxodrómica, que intersecta os meridianos sempre segundo o mesmo ângulo. Na carta de navegar em uso no século XVI, a linha loxodrómica não era, segundo Pedro Nunes (que se refere ao caso concreto do rumo de nordeste), nem um «círculo, nem linha direita» (isto é, recta), mas sim uma linha curva que o cosmógrafo representou numa figura inserida no seu Tratado em Defensão da Carta de Marear, publicado no corpo do Tratado da Esfera, de 1537; aliás, e referindo-se à mesma figura, o professor de Matemática da Universidade de Coimbra, e responsável pelos aspectos técnicos das navegações portuguesas, insiste que, para «navegar por arte», há dois modos, sendo o primeiro «manter uma mesma rota sem fazer mudança, e isto guardam sempre os navegantes»; todavia, adverte «mas a conta se há-de fazer por uma certa maneira de linhas curvas, como parece o nordeste desta figura e não por linha direita, como a carta mostra». A segunda alternativa, era a de navegar «por círculos maiores» (isto é, máximos); a primeira solução corresponde às linhas depois chamadas loxodrómicas e a segunda às linhas que receberam o nome de «ortodrómicas». Na obra publicada em 1537 (e reeditada mais tarde, em 1566, em língua latina, com alguns acréscimos explicativos), Nunes alude ao traçado de loxodrómicas e ortodrómicas em pomas (globos), que estariam em uso na marinharia, apesar de o rei D. Manuel as ter proibido, para o que veio a imaginar um «quadrante flexível» (descrito na versão latina do seu texto), admitindo Fontoura da Costa, sem qualquer prova, que o tenha utilizado na preparação de pomas com o traçado de rumos loxodrómicos (Marinharia dos Descobrimentos, 3ª ed., p. 277, Lisboa, 1960). Esse êxito viria a caber seguramente a Gerard Mercator (latinização do apelido Kremmer), que em 1541 fez construir um globo com as loxodrómicas de oito rumos traçados em cada quadrante, pretendendo alguns historiadores portugueses que por influência da leitura de Pedro Nunes. De qualquer maneira, não seria Nunes, mas Mercator, o primeiro a apresentar uma carta com as condições do globo loxodrómico; fê-lo em 1569, com a divulgação de um mapa em que adopta a hoje chamada «projecção cilíndrica isogónica de Mercator», ou «carta das latitudes crescidas», de que se conheciam até há poucos anos quatro originais e várias cópias, algumas delas recentes (a última que conhecemos data de 1932). A segunda designação é a mais conveniente, já que, para obter o resultado desejado de traçar por linhas rectas as loxodrómicas, Mercator teve a genial ideia de lançar na sua carta os paralelos com «um aumento progressivo, proporcionalmente à secante da latitude» (para reproduzir palavras de Fontoura da Costa). Ignora-se como o cosmógrafo flamengo chegou ao seu notável resultado, parecendo de aceitar a hipótese de que o obteve por processos gráficos, como defenderam Wagner e Marguet.
Artigo originalmente publicado no Dicionário de História dos Descobrimentos Portugueses, dir. Luís de Albuquerque, e reproduzido por cortesia do Círculo de Leitores
Artigo originalmente publicado no Dicionário de História dos Descobrimentos Portugueses, dir. Luís de Albuquerque, e reproduzido por cortesia do Círculo de Leitores