Data de publicação
2009
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Capitania hereditária (1534-1654), capitania real (1654-1715), capitania geral (1715-1815) e província do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves (1815-1822), situa-se, geograficamente, a 08°0'S e 37°0'W.

Sua história social, política, administrativa e econômica começa efetivamente em 1534, com a transposição para a América do sistema de capitanias. Ao iniciar seu governo em abril de 1535, Duarte Coelho Pereira, o primeiro donatário, batizou-a de "Nova Lusitânia", mas ela logo se tornou conhecida por seu nome indígena, cujo significado é "pedra furada" - uma alusão ao recife escavado pelo mar existente em seu porto. Tentando superar a fase extrativa anterior, introduziu e alargou um sistema agrícola semelhante ao que se desenvolveu desde o século XV nas ilhas atlânticas, que pressupunha a criação de engenhos e fazendas de canas e o comércio do açúcar à distância. Ao longo de sua administração, técnicos no fabrico do açúcar, comerciantes, marinheiros de cabotagem, lavradores de mantimentos e criadores de animais também foram estimulados a se dirigir a Pernambuco. Muitos levaram consigo negros escravos nascidos na Península Ibérica ou nas ilhas atlânticas. Tratava-se, pois, de espaço cuja estratificação social era forjada desde seu nascedouro. Até 1553, cinco engenhos de açúcar haviam sido construídos, os quais se localizavam entre Igarassu, ao Norte, e a várzea do Capibaribe, a Sudoeste. Com a ocupação de terras desde a várzea do rio Jaboatão até Porto Calvo, em direção ao Sul, o número de engenhos aumentou de 23 em 1570 para 66 em 1583, e de 90 em 1612 para 150 unidades em 1629. A segunda capitania açucareira mais importante, a da Bahia, contabilizava 80 engenhos em 1629. Entre fins do século XVI e primeiras duas décadas do século XVII, Pernambuco foi o maior produtor mundial de açúcar. O consumo sumptuário dos moradores de sua capital, a vila de Olinda, fundada em 1537, bem como a riqueza de seu artesanato, ofícios religiosos e de suas festas, amplamente destacados pela literatura coeva, são reflexos desta condição. Olinda e Igarassu recebem, entre 1593 e 1595, a primeira Visitação do Santo Ofício às partes do Brasil, atestando, além de sua opulência, seus pecados. Para tocar seus empreendimentos agrícolas e serviços domésticos, os colonos escravizaram grupos de língua Tupi que habitavam a costa setentrional - Caetés, Tabajaras e Potiguares. Após as epidemias e a crise demográfica das décadas de 1560, 1590 e 1610, senhores de engenho e demais lavradores investiram na importação de escravos africanos, inaugurando relação bilateral no Atlântico Sul que se tornaria multissecular. Por volta de 1618, os Diálogos das grandezas do Brasil se referem à criação, em Pernambuco, de "um novo Guiné com a multidão de escravos vindos dele". Foi esta primeira geração de africanos que, a partir de 1604, iniciou ao Sul da capitania a formação de Palmares, o maior quilombo da América portuguesa. Este conjunto de sociedades formadas por escravos evadidos de fazendas e engenhos chegou a reunir até sua destruição, em 1695, entre 6 mil e 20 mil pessoas. Palmares, no entanto, adquiriu grandes proporções e enorme capacidade de resistência a partir das Guerras do Açúcar, as quais apresentam duas fases. A primeira (1630-1635) foi marcada pela invasão de Pernambuco pela Companhia das Índias Ocidentais. Esta objetivava o controle da produção e do comércio do açúcar, bem como do tráfico de escravos. A segunda fase (1645-1654) se refere à guerra de expulsão e restauração do domínio luso. Ao longo dos 25 anos de sua permanência, notadamente durante o governo de Nassau (1637-1642), os holandeses concederam maior importância ao porto marítimo e povoado do Recife, localizado ao Sul de Olinda. Aí edificaram residências e prédios administrativos, palácios, bairros e pontes, bem como abriram canais e planejaram futuras áreas urbanas. Ao fim da guerra, em 1654, a economia açucareira estava em ruínas. Dos 150 engenhos que funcionavam em 1629, 65 estavam parados em 1637, sendo, ademais, confiscados. Entre 1645 e 1654, um terço de todos os engenhos estava paralisado. Muitos proprietários fugiram para capitanias do Sul, levando consigo capitais e escravos. Depois de 1654, a Bahia se tornou centro de maior produção açucareira e concentração de cativos da América portuguesa. No plano imperial, à medida que travava sua guerra de restauração (1640-1688), Portugal firmou tratado de paz com os Países Baixos em 1641 que não previa a imediata restituição de Pernambuco à Coroa lusa. A revolta contra os holandeses de 1645 foi, pois, empreendida apesar do tratado, e motivada tanto pelas dívidas contraídas junto a Companhia como por interesses em engenhos confiscados. No entanto, os colonos envolvidos na guerra brasílica inculcaram a idéia de que fora "a custa de suas vidas, sangue e fazendas" que haviam expulsado os holandeses mediante a formação de exército multirracial recrutado na América. Uma vez restaurado o domínio português, sentiam-se vassalos políticos, e não apenas naturais, da Coroa. Esta, no entanto, tornou Pernambuco capitania real a partir de 1654, desenraizando as pretensões donatariais, e cedeu ocasionalmente às demandas locais por nomeação de pessoas da "nobreza da terra" para cargos e ofícios da república, mormente o de governador e capitão general. A deposição, pela câmara de Olinda, do governador Jerônimo de Mendonça Furtado, em 1666, foi sintoma destes conflitos. Até fins do século XVII, Pernambuco viveu crise sem precedentes, como reflexo tanto da guerra como da perda do monopólio brasileiro da produção mundial de açúcar. Ao mesmo tempo, o preço do produto caiu drasticamente. Em 1654 a arroba era vendida a 3.800 réis e em 1685 não valia mais que 1.300 réis. Por outro lado, o abalado prestígio da nobreza da terra era contrabalançado pela migração de reinóis, os quais exerciam ofícios públicos, mormente militares, ou ligados ao comércio. Alguns se tornaram arrematadores da cobrança de impostos, e passaram a controlar o tráfico de cativos e o comércio de grosso trato, principalmente o do açúcar. Ocuparam, pois, o vazio deixado pelos holandeses e completaram a diferenciação social entre mercadores e proprietários de terras. A pretensão desse grupo de "mascates", como foi apelidado, era controlar o comércio colonial a partir do porto do Recife, onde passaram a residir. Em 1709 a Coroa elevou o antigo povoado à condição de vila, onde, ademais, foram criadas instituições de prestígio, como uma ordem terceira e batalhões de ordenanças. Uma vez que os recifenses dispunham de instrumento político - a câmara da vila - que lhes permitia intervir diretamente nos negócios do açúcar, além de controlar a oferta e os preços de cativos, com a preferência dada aos mercados do Sul, aquecidos pela exploração do ouro, à nobreza da terra não restou outro recurso senão as armas. Entre 1710 e 1715, uma guerra civil e a repressão que se lhe seguiu acarretaram ainda mais prejuízos à capitania. Na década de 1750, quando Pombal tentou instituir companhias monopolísticas de comércio no Estado do Brasil, apenas teve sucesso em Pernambuco. Seu logro deveu-se, em boa medida, à divisão ferrenha e, ainda viva, entre "nobres" e "mascates". Na segunda metade do século XVIII, porém, sobretudo após o fechamento da malograda Companhia de Comércio, em 1780, a capitania viveu seu "renascimento agrícola". Os engenhos aumentaram em número e as exportações duplicaram. O algodão passou a ser plantado ao Sul, na comarca de Alagoas, e ao Norte, na região de Goiana. A demanda da revolução industrial, a abertura dos portos em 1808 e a instalação de casas comerciais francesas e britânicas ao longo da década de 1810 fizeram com que, nesta mesma década, o valor das exportações algodoeiras superasse o do açúcar. Tal prosperidade, contudo, contrastava com o sistema fiscal criado por Dom João entre 1808 e 1810, que beneficiava a capitania do Rio de Janeiro e suas vizinhas em detrimento das demais, situadas ao Norte. Ao mesmo tempo, à percepção das revoluções atlânticas, fosse a americana ou as hispânicas, unia-se a identidade coletiva pernambucana forjada nos séculos XVII e XVIII, conferindo a esta um conteúdo político moderno. Resgatou-se, então, a ideologia da vassalagem política criada após a restauração da capitania, e continuada na guerra civil de 1710-1711. A revolução de 1817 contra o Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves adotou padrões então vigentes no mundo atlântico, como o republicanismo, o liberalismo, o federalismo e a separação de poderes, e estabeleceu como formato administrativo a Junta de Governo. Após três meses de governo autônomo, a província sofreu duríssima repressão, com execução de 14 "patriotas", além das dezenas de deportações e encarceramentos. A deposição do último governador colonial, Luis do Rego Barreto, em agosto de 1821, na esteira da revolução do Porto, foi compreendida pelos pernambucanos como o ápice de processo iniciado em 1817. Seus deputados, quase todos militantes na revolução de 1817, foram os primeiros da América a chegar às Cortes, em agosto de 1821, e Pernambuco era a única província no Brasil que viveu, antes do constitucionalismo, a experiência de eleger e governar através de Junta. O partido federalista, radicado no Recife e ao Norte, baseado no algodão e no comércio multilateral, apoiou o constitucionalismo monárquico lisboeta até seus estertores. Contudo, foi, finalmente, derrotado em setembro de 1822 pelo partido dos "matutos", baseado na produção e comércio tradicional do açúcar e radicado no Sul. Este apoiou o projeto da independência criado pelos próceres do Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais, e selou a ruptura política definitiva de Pernambuco com Portugal. lgs_pernambuco.

Bibliografia:
BERNARDES, Denis de M. O patriotismo constitucional: Pernambuco, 1820-1822. São Paulo/Recife: Editora Universitária da UFPE/Hucitec, FAPESP, 2006. MELLO, Evaldo Cabral de Mello. Olinda restaurada. Guerra e açúcar no Nordeste, 1630-1654. Rio de Janeiro/São Paulo: Forense Universitária/Edusp, 1975. MELLO, José Antonio Gonsalves de. Nobre e mascates na Câmara do Recife (1713-1738). Revista do Instituto Arqueológico, Histórico e Geográfico Pernambucano. Vol. LIII, 1981, pp. 113-260. SCHWARTZ, Stuart B. Segredos internos. Engenhos e escravos na sociedade colonial (1550-1835). Trad. Laura Teixeira Motta. S. Paulo/Brasília: Cia. das Letras/CNPq, 1988.