Data de publicação
2012
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A família dos Hirschvogel estabeleceu-se em finais do século XIV em Nuremberga, na Alta Alemanha, e ascendeu, no decorrer do século seguinte, ao patriciado da cidade dedicando-se ao comércio. A sua promoção acelerada prendeu-se, em primeiro lugar, com as suas relações comerciais bem sucedidas com Veneza, que conduziram a um alargamento dos seus negócios na Europa.
As intensas ligações de parentesco com as famílias nuremberguesas dos Imhoff e dos Behaim desempenharam um papel decisivo quando a Casa dos Hirschvogel pretendeu criar relações económicas com a coroa portuguesa. Assim, o primeiro contacto com Portugal deve ter sido estabelecido através de Martin Behaim (1459-1507), famoso mercador e aventureiro de Nuremberga, que se encontrou, na primeira metade do ano 1484, ao serviço dos Hirschvogel em Antuérpia. Neste mesmo ano daí partiu para Lisboa, sendo armado cavaleiro por D. João II em Fevereiro de 1485 antes de participar numa viagem à costa ocidental africana. Martin Behaim conseguiu chamar a atenção das grandes casas comerciais de Nuremberga para a Expansão Portuguesa, quando teve, nos anos 90 do século XV, uma estadia prolongada na sua cidade natal. Os Behaim e os Hirschvogel encontravam-se ligados devido a vários laços matrimoniais. Martin Behaim era sobrinho de Lienhart Hirschvogel, que esteve à frente da empresa entre 1440 e 1490, e primo de Lienhart II (1440-1525) que liderou a firma no primeiro quartel do século XVI.
No início do século XVI os Hirschvogel decidiram manter uma representação permanente na capital portuguesa. Após a chegada à Europa das primeiras especiarias provenientes do espaço do Oceano Índico pela Rota do Cabo, várias casas comerciais da Alta Alemanha enviaram os seus agentes à corte portuguesa para entrarem em negociações directas com D. Manuel I. Solicitaram a concessão de privilégios em terras portuguesas para poderem participar directamente no comércio ultramarino, tendo ainda a intenção de erguer feitorias em Lisboa. Não se sabe ao certo quando os Hirschvogel se instalaram na cidade do Tejo, mas deixa-se provar a existência da sua feitoria na segunda metade do ano 1506. Já em 1505 tinham participado numa viagem à Índia. Entraram com um capital de 2.000 Cruzados dos 65.400 que um consórcio, composto por empresas alemãs e mercadores italianos, investiu em três navios da frota de D. Francisco de Almeida. Ulrich Imhoff, um cunhado de Lienhart Hirschvogel (II), acompanhou a armada a bordo da nau São Jerónimo. O investimento do consórcio deu um lucro que rondou os 150%, mas permaneceu um acontecimento único, porque D. Manuel I tinha entretanto monopolizado o comércio da pimenta e dificultado a entrega da mercadoria a que o consórcio teve direito.
Os primeiros feitores que os Hirschvogel mantiveram em Lisboa foram Ulrich Imhoff e Wolf Behaim, o irmão mais novo de Martin Behaim. Todos eles morreram em 1507 nesta cidade, provavelmente vítimas da peste. Nos anos seguintes há apenas notícias muito escassas sobre as actividades comerciais dos Hirschvogel em Portugal, mas em meados da segunda década do século XVI relançaram aí os seus negócios, especializando-se no comércio de pedras preciosas. Tornaram-se, a par dos Herwart de Augsburgo, as únicas empresas alemãs que compraram pedras preciosas e pérolas directamente na Índia. Para este efeito enviaram os seus agentes comerciais, Lazarus Nürnberger e Jörg Pock, à Ásia. Lazarus Nürnberger acompanhou, em 1517, a frota de António de Saldanha a bordo da nau Santiago (a grande). A estadia deste empregado dos Hirschvogel na Costa do Malabar em 1517/18 serviu para a observação do mercado e da situação política no espaço do Oceano Índico. A missão de Jörg Pock foi mais duradoura. Na função de representante dos Hirschvogel e dos Herwart viajou, em 1520, na frota de Jorge de Brito para a Índia, onde permaneceu até à sua morte em 1529. Numa carta que enviou, em Janeiro de 1522, de Cochim para Nuremberga, assumiu uma posição muito crítica relativamente à governação dos Portugueses no Estado da Índia, que tinha, na sua perspectiva, conduzido a uma acentuada crise económica e a uma estagnação do comércio da pimenta. O seu interesse mercantil residia, em primeiro lugar, nas pedras preciosas, principalmente nos diamantes de Vijayanagar, no reino hindu de Bisnaga (ou Narsinga), onde esteve, em 1521, durante vários meses. A compra e venda de pedras preciosas tiveram um papel fundamental nos planos dos Hirschvogel. Nos anos 20 do século XVI este ramo comercial tornou-se o mais rentável para esta casa.
Entre as mercadorias que introduziram em Portugal destacaram-se os produtos de lã, linho e, a partir de finais da segunda década do século XVI, sobretudo metais preciosos, sempre muito procurados pela coroa portuguesa como meio de troca no comércio colonial. Entre 1517 e 1524 os feitores dos Hirschvogel, Joachim Prunner (nos documentos portugueses: “Jouchin”), Jörg Pock (“Pollo”), Friedrich Löner (“Frederico Lomer”) e Christoph Spaigel (“Christovão Spavel”) forneceram quantias consideráveis de prata à Casa da Moeda. Desde 1525 os lucros que os Hirschvogel obtiveram do comércio ultramarino já não chegaram, a longo prazo, para tapar o endividamento crescente da empresa, que entrou em decadência na quarta década do século XVI. Por volta de 1532 encerraram a sua feitoria em Lisboa e retiraram-se definitivamente de Portugal.
Bibliografia:
EHRHARDT, Marion, A Alemanha e os Descobrimentos Portugueses, Lisboa, Texto, 1989; KELLENBENZ, Hermann, “The Portuguese Discoveries and the Italian and German Initiatives in the Indian Trade in the first two Decades on the 16th Century”, in: Congresso internacional «Bartolomeu Dias e a sua Época». Actas, vol. 3, Porto, Universidade do Porto, 1989, pp. 609-623; idem (ed.), Fremde Kaufleute auf der Iberischen Halbin¬sel, Köln/ Wien, Böhlau, 1970; POHLE, Jürgen, Deutschland und die überseeische Expansion Portugals im 15. und 16. Jahrhundert, Münster, Lit, 2000; SCHAPER, Christa, Die Hirschvogel von Nürnberg und ihr Handelshaus, Nürnberg, Verein für Geschichte der Stadt Nürnberg, 1973.
As intensas ligações de parentesco com as famílias nuremberguesas dos Imhoff e dos Behaim desempenharam um papel decisivo quando a Casa dos Hirschvogel pretendeu criar relações económicas com a coroa portuguesa. Assim, o primeiro contacto com Portugal deve ter sido estabelecido através de Martin Behaim (1459-1507), famoso mercador e aventureiro de Nuremberga, que se encontrou, na primeira metade do ano 1484, ao serviço dos Hirschvogel em Antuérpia. Neste mesmo ano daí partiu para Lisboa, sendo armado cavaleiro por D. João II em Fevereiro de 1485 antes de participar numa viagem à costa ocidental africana. Martin Behaim conseguiu chamar a atenção das grandes casas comerciais de Nuremberga para a Expansão Portuguesa, quando teve, nos anos 90 do século XV, uma estadia prolongada na sua cidade natal. Os Behaim e os Hirschvogel encontravam-se ligados devido a vários laços matrimoniais. Martin Behaim era sobrinho de Lienhart Hirschvogel, que esteve à frente da empresa entre 1440 e 1490, e primo de Lienhart II (1440-1525) que liderou a firma no primeiro quartel do século XVI.
No início do século XVI os Hirschvogel decidiram manter uma representação permanente na capital portuguesa. Após a chegada à Europa das primeiras especiarias provenientes do espaço do Oceano Índico pela Rota do Cabo, várias casas comerciais da Alta Alemanha enviaram os seus agentes à corte portuguesa para entrarem em negociações directas com D. Manuel I. Solicitaram a concessão de privilégios em terras portuguesas para poderem participar directamente no comércio ultramarino, tendo ainda a intenção de erguer feitorias em Lisboa. Não se sabe ao certo quando os Hirschvogel se instalaram na cidade do Tejo, mas deixa-se provar a existência da sua feitoria na segunda metade do ano 1506. Já em 1505 tinham participado numa viagem à Índia. Entraram com um capital de 2.000 Cruzados dos 65.400 que um consórcio, composto por empresas alemãs e mercadores italianos, investiu em três navios da frota de D. Francisco de Almeida. Ulrich Imhoff, um cunhado de Lienhart Hirschvogel (II), acompanhou a armada a bordo da nau São Jerónimo. O investimento do consórcio deu um lucro que rondou os 150%, mas permaneceu um acontecimento único, porque D. Manuel I tinha entretanto monopolizado o comércio da pimenta e dificultado a entrega da mercadoria a que o consórcio teve direito.
Os primeiros feitores que os Hirschvogel mantiveram em Lisboa foram Ulrich Imhoff e Wolf Behaim, o irmão mais novo de Martin Behaim. Todos eles morreram em 1507 nesta cidade, provavelmente vítimas da peste. Nos anos seguintes há apenas notícias muito escassas sobre as actividades comerciais dos Hirschvogel em Portugal, mas em meados da segunda década do século XVI relançaram aí os seus negócios, especializando-se no comércio de pedras preciosas. Tornaram-se, a par dos Herwart de Augsburgo, as únicas empresas alemãs que compraram pedras preciosas e pérolas directamente na Índia. Para este efeito enviaram os seus agentes comerciais, Lazarus Nürnberger e Jörg Pock, à Ásia. Lazarus Nürnberger acompanhou, em 1517, a frota de António de Saldanha a bordo da nau Santiago (a grande). A estadia deste empregado dos Hirschvogel na Costa do Malabar em 1517/18 serviu para a observação do mercado e da situação política no espaço do Oceano Índico. A missão de Jörg Pock foi mais duradoura. Na função de representante dos Hirschvogel e dos Herwart viajou, em 1520, na frota de Jorge de Brito para a Índia, onde permaneceu até à sua morte em 1529. Numa carta que enviou, em Janeiro de 1522, de Cochim para Nuremberga, assumiu uma posição muito crítica relativamente à governação dos Portugueses no Estado da Índia, que tinha, na sua perspectiva, conduzido a uma acentuada crise económica e a uma estagnação do comércio da pimenta. O seu interesse mercantil residia, em primeiro lugar, nas pedras preciosas, principalmente nos diamantes de Vijayanagar, no reino hindu de Bisnaga (ou Narsinga), onde esteve, em 1521, durante vários meses. A compra e venda de pedras preciosas tiveram um papel fundamental nos planos dos Hirschvogel. Nos anos 20 do século XVI este ramo comercial tornou-se o mais rentável para esta casa.
Entre as mercadorias que introduziram em Portugal destacaram-se os produtos de lã, linho e, a partir de finais da segunda década do século XVI, sobretudo metais preciosos, sempre muito procurados pela coroa portuguesa como meio de troca no comércio colonial. Entre 1517 e 1524 os feitores dos Hirschvogel, Joachim Prunner (nos documentos portugueses: “Jouchin”), Jörg Pock (“Pollo”), Friedrich Löner (“Frederico Lomer”) e Christoph Spaigel (“Christovão Spavel”) forneceram quantias consideráveis de prata à Casa da Moeda. Desde 1525 os lucros que os Hirschvogel obtiveram do comércio ultramarino já não chegaram, a longo prazo, para tapar o endividamento crescente da empresa, que entrou em decadência na quarta década do século XVI. Por volta de 1532 encerraram a sua feitoria em Lisboa e retiraram-se definitivamente de Portugal.
Bibliografia:
EHRHARDT, Marion, A Alemanha e os Descobrimentos Portugueses, Lisboa, Texto, 1989; KELLENBENZ, Hermann, “The Portuguese Discoveries and the Italian and German Initiatives in the Indian Trade in the first two Decades on the 16th Century”, in: Congresso internacional «Bartolomeu Dias e a sua Época». Actas, vol. 3, Porto, Universidade do Porto, 1989, pp. 609-623; idem (ed.), Fremde Kaufleute auf der Iberischen Halbin¬sel, Köln/ Wien, Böhlau, 1970; POHLE, Jürgen, Deutschland und die überseeische Expansion Portugals im 15. und 16. Jahrhundert, Münster, Lit, 2000; SCHAPER, Christa, Die Hirschvogel von Nürnberg und ihr Handelshaus, Nürnberg, Verein für Geschichte der Stadt Nürnberg, 1973.