Data de publicação
2009
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Filamento obtido através do douramento de folhas de papel (normalmente, de arroz ou feito a partir de madeira da Amoreira) impregnadas de cola animal ou resina, sobre a qual se aplica uma camada de bolus seguida de ouro, em folha ou em pó, ao qual se segue o corte do papel em finíssimas tiras, depois individualmente enroladas em torno de filamentos de seda (alma).

Este fio afirma-se como uma das mais importantes matérias-primas usadas na produção têxtil chinesa destinada ao consumo interno e à exportação, como se reconhece naquela sino-portuguesa, especificamente realizada para o mercado lusófono.

Da mesma forma se destaca como um de entre os muitos artigos de luxo que tanto impressionaram os portugueses e outros europeus que à China se deslocaram (sobretudo, a partir de meados do século XVI). Uma análise atenta de relatos e descrições que se foram coligindo em torno do Celeste Império, entre os séculos XVI e XVIII, confirma este apreço. Com efeito, os investigadores dispõem de informes de natureza diversa acerca do referido fio graças, sobretudo ao empenho dos padres da Companhia de Jesus, como Álvaro Semedo, António de Gouveia e, mais tarde Du Haldé, sensíveis e deveras interessados em tudo o que se reportava àquela nação, mas também a membros de outras ordens religiosas, como o agostinho Juan Gonzalez de Mendoza e o dominicano Gaspar da Cruz e, até, de civis, como o negociante florentino Francesco Carletti (1573-1636).

O fio de ouro chinês despertou, desde cedo, uma verdadeira admiração entre os estrangeiros, não só das nações adjacentes à China, como a Coreia e o Japão, mas também dos europeus quando chegaram àquele extremo do globo. Trata-se de um fenómeno a que não foram indiferentes a sua composição, o procedimento empregue com vista à sua obtenção - que, completamente distinto daquele utilizado nos trabalhos têxteis europeus, permaneceu misterioso na Europa, até às últimas décadas do século XVIII -, o seu uso de forma difusa e abrangente, entre a população autóctone e, não menos importante, o seu preço, muito inferior ao do seu congénere europeu.

Todos estes aspectos contribuíram para que este fio metálico cedo fosse incorporado nas listagens de artigos a comerciar entre os chineses e os forasteiros, sendo de notar que a sua transacção não se confinava ao território do Celeste Império. Na verdade e, muito embora os chineses estivessem impedidos de sair do país, sabe-se que os nativos do Sul levavam o fio de ouro não só às Filipinas mas ainda à Batávia. Também através de Duarte de Sande e Alessandro Valignano, é dada notícia da participação de portugueses na sua aquisição na China e comercialização, respectivamente, na Índia e no Japão, ávido consumidor dos artigos chineses, mormente das sedas, que consideravam de melhor qualidade que as suas. O reconhecimento desta realidade afigura-se da maior pertinência porquanto se tende a estabelecer que a presença do fio laminado de papel dourado em peças têxteis pressupõe a respectiva manufactura na China.

Bibliografia:
CHANG, Tien-Tsê, O Comércio Sino-português entre 1514 e 1644: Uma síntese de fontes portuguesas e chinesas, Macau, Instituto Português do Oriente, 1997. FERREIRA, Maria João Pacheco, As Alfaias Bordadas Sinoportuguesas Datáveis dos Séculos XVI a XVIII. Contextualização. Caracterização. Análise, Lisboa, Universidade Lusíada, 2007. FERREIRA, Maria João Pacheco, "Hilado por modo jamas visto en la Christandad. O fio de ouro chinês aos olhos dos europeus (séculos XVI a XVIII)", in Revista da Faculdade de letras - Ciências e Técnicas do Património, Porto, vol. VII, 2008 (no prelo). TÁVORA, Bernardo Ferrão Tavares e, A Imaginária Luso-oriental, Lisboa, Imprensa Nacional - Casa da Moeda, 1983.