Data de publicação
2009
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Cidade japonesa, situada na costa ocidental da ilha de Kyûshû. Localizada no fundo de uma baía, o seu nome significa em japonês cabo comprido. Está situada em 32I0; 44' N, 129I0; 52' E. Fundada em 1570, foi a única cidade criada pelos portugueses no Japão. Na sua origem esteve o desejo de encontrar um local seguro que pudesse servir de término habitual à nau do trato e que providenciasse ao mesmo tempo um porto de abrigo para vários cristãos desterrados das suas regiões. O seu estabelecimento foi o culminar de um processo de negociação entre Cosme de Torres, superior da missão japonesa, e Ômura Sumitada, senhor de Ômura, do qual fizeram parte as tentativas frustradas de fixação em Yokoseura em 1562 e em Fukuda em 1565. Após várias sondagens foi descoberto o local ideal no extremo sul de Ômura: uma baía ampla e profunda, protegida da fúria dos elementos naturais por um promontório e de eventuais ataques inimigos pelo conjunto montanhoso em que estava inserida. A região era relativamente conhecida dos jesuítas pois haviam já efectuado uma missão numa pequena aldeia estabelecida junto ao castelo de Nagasaki Jinzaemon Sumikage, genro e vassalo de Ômura, onde foi edificada uma igreja sob a invocação de Todos os Santos. Junto ao novo ancoradoiro foi estabelecida uma povoação, tendo as obras de construção começado na Primavera de 1571, ano que marca também o estabelecimento de Nagasáqui como ponto terminal do comércio transoceânico luso. A população inicial rondava as 1 500 pessoas, na sua maioria cristãs, divididas por seis bairros denominados de acordo com a proveniência dos seus habitantes. Em 1590 a cidade contava já com 5 000 habitantes, número que subiu para 15 000 em 1600 e para 30 000 em 1614.O seu crescimento ficou intimamente ligado aos dois propósitos que a viram nascer. Como porto terminal da nau do trato, Nagasáqui tornou-se no principal ponto de comércio de prata e de seda, constituindo-se como pólo de atracção tanto para mercadores japoneses como para estrangeiros. Destes últimos fazia parte uma comunidade lusa, que se fixou na cidade e casou com mulheres locais, contribuindo para a consolidação da presença portuguesa no Extremo Oriente, bem como para a divulgação das influências ocidentais. Aos residentes lusos juntou-se depois uma comunidade de mercadores chineses, existindo também alguns habitantes oriundos da Coreia. Do mesmo modo, também o carácter acolhedor subjacente à fundação de Nagasáqui contribuiu para o desenvolvimento da cidade pois aos cristãos exilados que constituíram o grosso dos habitantes iniciais juntaram-se muitos outros, movidos pelo facto de poderem expressar aí livremente a sua fé. Nagasáqui tornou-se a principal base de acção dos missionários no Japão a partir de 1585, substituindo Funai (Ôita), e aí residiu D. Luís Cerqueira, o único bispo que trabalhou permanentemente no Japão. Na cidade estiveram também centralizadas algumas das principais actividades da Companhia que passavam nomeadamente pela educação, produção artística e tipográfica. A presença de um elevado número de religiosos e o facto de ser habitada quase exclusivamente por cristãos, levou a que o seu quotidiano fosse marcado por uma vivência da religião mais próxima da realidade europeia. Foi também a única cidade japonesa organizada em paróquias, dispondo de infra estruturas de auxílio espiritual, tais como confrarias, e material, como a Misericórdia, fundada oficialmente em 1583. A vida de Nagasáqui foi igualmente marcada por uma forte influência cultural europeia, que contribuiu para fazer da cidade um espaço de confluência de elementos ocidentais e orientais, testemunhado nos célebres biombos namban. Principal ponto de contacto com o exterior, foi a porta de entrada de novos produtos, de animais exóticos, hábitos e conhecimentos, novidades que se espalharam depois ao restante território nipónico mas que em Nagasáqui foram assimiladas com maior consistência. A sua originalidade foi visível desde a sua criação pois um território encravado nas montanhas dificilmente teria sido escolhido pelos japoneses para fundar uma cidade. À data da sua edificação foi instituído um modelo urbanístico em quadrícula mas quando o espaço disponível se tornou exíguo, este modelo foi abandonado e a cidade estendeu-se sobre as colinas em ruas sinuosas. Este perfil "ocidentalizante" foi visível também na arquitectura, com a inclusão de torres de sinos e relógios em algumas das igrejas da cidade. Era igualmente perceptível nos hábitos do dia -a -dia como na língua (através da inclusão de palavras de origem portuguesa no dialecto local), no vestuário (com a adopção de peças de roupa, tecidos e acessórios de moda até então desconhecidos), na alimentação (com a entrada de novos alimentos na dieta japonesa) e na botânica (através da introdução de espécies vegetais de origem europeia e americana). Foi também em Nagasáqui que surgiram as primeiras obras científicas que denotam a influência ocidental, a saber, Genna Kokaisho (Livro náutico da era de Genna), de 1618 e Bangay-shuyo (Colectânea sumária dos conhecimentos médicos), escrito em 1619. A prosperidade de Nagasáqui cedo atraiu a cobiça dos seus vizinhos mais próximos: em 1573 foi atacada por Saigô Sumitaka, de Isahaya e Fukahori Sumikata, seu irmão, que repetiu a tentativa em 1579. Também Riûzoji Takanobu, senhor de Saga deu mostras de querer tomar Nagasáqui, facto que colocou Ômura Sumitada numa posição delicada. Para solucionar a situação e manter os lucros que advinham do comércio com os portugueses, Ômura Sumitada cedeu, em 1580, o porto e a cidade de Nagasáqui aos missionários jesuítas, juntamente com as terras de Mogi. A doação foi aceite pela Companhia de Jesus na condição de os missionários a poderem devolver aos locais quando entendessem. Ômura Sumitada continuou a deter a soberania do território mas a administração passou a estar a cargo dos jesuítas, que procediam à escolha de um yakunin (regedor), que recebia a jurisdição directamente das mãos de Ômura. A Companhia de Jesus administrou indirectamente a cidade até 1587, data em que Nagasáqui foi incorporada nos territórios sob dependência directa do poder central, na sequência do édito anti-cristão promulgado por Toyotomi Hideyoshi. Em 1592 foi elevada ao estatuto de cidade imperial, passando a ser administrada por um bugyo, coadjuvado por um daikan. Com estas medidas o poder nipónico tentou limitar a influência religiosa na cidade ao mesmo tempo que chamou a si o controlo do comércio com os portugueses. Foi precisamente por força deste comércio que a presença de missionários foi tolerada e, aos poucos, Nagasáqui foi retomando a sua vida normal, ainda que tenha assistido a algumas perturbações, como o martírio de vinte e seis cristãos em 1597. A viragem para o século XVII marcou o início de uma nova conjuntura para Nagasáqui, com a consolidação do poder de Tokugawa Ieyasu à frente dos destinos nipónicos e com a entrada de novos concorrentes comerciais europeus. Logo no início de Seiscentos a cidade assistiu a dois acontecimentos que afectaram o relacionamento luso-nipónico: em 1606, uma crise com Ômura Yoshiaki, devido a uma reorganização administrativa dos territórios de Nagasáqui, levou ao corte de relações do dáimio com a Igreja e em 1610 o incidente com a nau Madre de Deus conduziu a uma quebra momentânea nas trocas comerciais. Às perturbações do trato com os portugueses o Japão pôde, no entanto, contrapor as alternativas apresentadas com a presença de espanhóis, holandeses e ingleses, com feitorias em Hirado desde 1609 e 1613, respectivamente. Uma vez que a continuidade do comércio era assegurada sem que fosse necessário tolerar o Cristianismo, em 1614 foi decretado um novo édito, com consequências mais drásticas para Nagasáqui do que o primeiro. Embora inicialmente existisse alguma permissividade do poder central em relação aos cristãos de Nagasáqui, a partir de 1618 a luta para erradicar o Cristianismo intensificou-se. A cidade foi palco de novas execuções em 1619 e em 1622. Cientes da ajuda dada pelos comerciantes portugueses aos missionários na clandestinidade, as autoridades nipónicas procuraram limitar a sua acção. Por conseguinte, em 1623 foi proibida a residência permanente de mercadores lusos na cidade e nos anos seguintes foram impostas novas regras sobre o funcionamento do trato. A partir de 1636 os tripulantes da nau foram obrigados a permanecer em Deshima, uma ilha artificial construída na baía de Nagasáqui. Com o relacionamento luso-nipónico cada vez mais degradado, o governo japonês decidiu-se pelo corte de relações. Assim, quando em 1639 o capitão-mor Vasco Palha chegou a Nagasáqui, foi impedido de desembarcar a carga e informado que a partir dessa data os portugueses estavam proibidos de entrar no Japão. Em 1640 a cidade de Macau enviou uma embaixada para tentar reverter a situação mas a maioria dos seus emissários foram executados por desrespeito às leis japonesas. Nagasáqui e Deshima continuariam a ser a ponte de contacto com os Europeus, mas tendo os Holandeses como interlocutores.
Bibliografia:
COSTA, João Paulo Oliveira e, O Cristianismo no Japão e o Episcopado de D. Luís de Cerqueira, dissertação de doutoramento em História apresentada à Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, Lisboa, 1998 (texto fotocopiado). PACHECO, Diego S.J., El hombre que forjó a Nagasaki. Vida del Padre Cosme de la Torres S. J., Madrid, Editorial Apostolado de la Prensa, 1973, A Fundação do Porto de Nagasáqui e a sua cedência à Sociedade de Jesus, Macau, Centro de Estudos Marítimos de Macau, 1989. RODRIGUES, Helena Barros, Nagasáqui Nanban. Das origens à expulsão dos portugueses, dissertação de mestrado em História e Arqueologia dos Descobrimentos e da Expansão Portuguesa apresentada à Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, Lisboa, 2006 (texto fotocopiado).
Bibliografia:
COSTA, João Paulo Oliveira e, O Cristianismo no Japão e o Episcopado de D. Luís de Cerqueira, dissertação de doutoramento em História apresentada à Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, Lisboa, 1998 (texto fotocopiado). PACHECO, Diego S.J., El hombre que forjó a Nagasaki. Vida del Padre Cosme de la Torres S. J., Madrid, Editorial Apostolado de la Prensa, 1973, A Fundação do Porto de Nagasáqui e a sua cedência à Sociedade de Jesus, Macau, Centro de Estudos Marítimos de Macau, 1989. RODRIGUES, Helena Barros, Nagasáqui Nanban. Das origens à expulsão dos portugueses, dissertação de mestrado em História e Arqueologia dos Descobrimentos e da Expansão Portuguesa apresentada à Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, Lisboa, 2006 (texto fotocopiado).