Data de publicação
2009
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Nome pelo qual ficou conhecida a embarcação que fazia a ligação comercial entre a Índia e o Japão. Também designada como nau da prata, nau da China, nau do trato de Macau e Kurofune (navio negro). Nos anos que se seguiram à chegada dos portugueses ao Japão, vários locais da ilha de Kyushû foram visitados por aventureiros e mercadores privados. Por esta altura, não existia um porto fixo e toda a actividade era levada acabo por particulares, quer em navios próprios, quer em juncos chineses. Apesar dos riscos inerentes à viagem (naufrágios, pirataria) o comécio era muito rentável pois devido ao corte de relações entre a China e o Japão os mercadores portugueses passaram a agir como intermediários entre os dois países. Cedo as autoridades portuguesas perceberam a importância deste comércio e chamaram para si o controlo da rede mercantil, conseguindo avultados lucros e consolidando a sua presença no Extremo Oriente. Assim, a partir de 1550, foi criada uma viagem anual que passou a ser monopólio da Coroa. A viagem ficava a cargo de um capitão-mor, posto atribuido pelas autoridades oficiais como recompensa por serviços prestados. A viagem da nau do trato foi por vezes também doada pela Coroa a algumas entidades como a cidade de Macau, Cochim, Malaca e a um mosteiro de freiras agostinhas em Madrid. Mais tarde, de forma a aumentar o erário régio, passou a ser leiloada em Goa, sendo vendida pelo lance mais elevado. Inicialmente a viagem tinha como ponto de partida Malaca, sendo depois substituido por Goa. A partir de 1557, com o estabelecimento de Macau, esta cidade passou a ser paragem obrigatória na rota da nau do trato, que teve como término habitual a cidade de Nagasáqui. Numa viagem rotineira a nau saía de Goa em Abril ou Maio, carregada com tecidos de algodão, tecidos indianos, objectos de cristal e vidro, relógios da Flandres e vinhos portugueses. Por vezes seguiam também alguns objectos mais exóticos que eram depois oferecidos aos senhores japoneses. Cerca de um mês depois, a nau aportava em Malaca, onde parte da carga era trocada por especiarias, madeiras aromáticas (como sândalo e aloés) e peles de animais. De Malaca, dirigia-se para Macau, chegando entre o fim de Junho e Agosto. Nesta cidade era necessário efectuar uma paragem de cerca de dez a doze meses, uma vez que o grosso da carga para o Japão era constituído por seda em rama, oriunda da China Central. A seda era obtida nas feiras semestrais de Cantão, realizadas em Dezembro/Janeiro e Maio/Junho, estando os contactos entre os mercadores previamente estabelecidos. Para além da seda faziam também parte da carga porcelanas, almíscar e oiro. Depois de carregada a nau era necessário aguardar pelas monções favoráveis para poder seguir viagem. Entre o fim de Junho e Agosto a nau partia para o Japão, podendo demorar cerca de um mês a chegar. A nau permanecia no porto de Nagasáqui à espera da monção de Outubro/Novembro e, caso se atrasasse, apenas poderia partir em Fevereiro/Março do próximo ano. Carregado de prata, mobiliário e biombos, peças lacadas e espadas, o navio iniciava a viagem de regresso. Caso conseguisse partir de Nagasáqui em Novembro, chegava a Macau entre Dezembro e Janeiro. Neste porto era descarregada a prata, para negociar a seda do ano seguinte, e seguiam viagem em direcção a Goa oiro, seda, porcelanas, onde chegavam em Abril. Ainda que estes fossem os principais bens transaccionados nesta rota, ao longo dos tempos outros produtos foram sendo incluídos. Assim, nos últimos anos do comércio efectuado pelos Portugueses, de Macau seguiu para Nagasáqui tecidos de seda e de Nagasáqui para Macau cobre, muito usado na fundição de peças de artilharia e em moeda. Durante o início das relações comerciais era também prática habitual o negócio de escravos, sendo levados para Goa Japoneses e prisioneiros de guerra Coreanos. Esta prática, apesar de proibida pela legislação portuguesa e nipónica continuou a efectuar-se mas tendeu a diminuir com o passar dos anos. Para além das mercadorias transaccionadas a nau do trato servia também como meio de transporte de missionários, alfaias religiosas e correspondência, sobretudo no eixo Macau-Japão. A sua importância ficou registada nos biombos namban, onde a nau do trato é uma das figuras centrais das composições criadas pelos pintores japoneses. Se até finais do século XVI a nau do trato constituiu uma carreira regular, com o início de Seiscentos começaram a surgir dificuldades em efectuar a viagem, sobretudo a partir da chegada de outras potências europeias aos mares do Extremo Oriente. Os circuitos comerciais estabelecidos pelos portugueses passaram a ser disputados por Espanhóis, Holandeses e Ingleses, pondo fim ao monopólio luso no comércio asiático. À tentativa de estabelecer redes de comércio concorrentes acrescentava-se também o ataque a possessões e rotas controladas pelos portugueses, levadas a cabo sobretudo pelos navios holandeses, que desta forma impediram por diversas vezes a realização da viagem até ao Japão. Para tentar minorar os prejuízos resultantes dos ataques inimigos em 1618 a prática de enviar todas as mercadorias numa única embarcação foi substituida pela divisão da carga por vários navios. Assim, o comércio habitualmente levado a cabo por uma nau ou galeão passou a ser efectuado por embarcações de dimensões menores como os pataxos, navetas ou galeotas. Outros factores concorreram também para a dificulade da realização da viagem da nau do trato. Para além dos motivos climáticos e naturais e da má gerência do circuito por parte da Coroa e dos mercadores de Macau, as alterações políticas no Japão e os conflitos com as autoridades nipónicas impediram também o trato regular com este país. Se com a promulgação do édito anti-cristão de 1587 o relacionamento comercial fora já abalado - embora tenha continuado a efectuar-se devido à falta de alternativas comerciais viáveis - após a subida ao poder da casa Tokugawa as transacções tornaram-se mais difíceis. A estreita ligação entre os comerciantes de Macau e os religiosos que actuavam no Japão não era bem acolhida pelo poder central nipónico e com a promulgação de um novo édito anti-cristão em 1614 também as relações comerciais sofreram as consequências desta política. Embora tivesse sido decretada a expulsão de todos os missionários, os mercadores portugueses continuaram a prestar auxílio aos religiosos na clandestinidade. A sua atitude punha em causa a sobrevivência do circuito comercial, tanto mais que foram descobertos vários casos de ajuda comprovada de comerciantes a missionários. Assim, e após ter garantido a continuidade do tráfico através do Holandeses, em 1639 as autoridade nipónicas decidiram-se pelo corte de relações com os mercadores portugueses, pondo fim às viagens da nau do trato.
Bibliografia: BOXER, Charles R., Portuguese merchants and missionaries in feudal Japan. 1543-1640, Londres, Variorum Reprints, 1986. IDEM, O Grande navio de Amacau, Lisboa, Fundação Oriente e Centro de Estudos Marítimos de Macau, 1989. LEITÃO, Ana Maria Ramalho Prosérpio, Do Trato Português no Japão: Presenças que se cruzam (1543-1639), dissertação de mestrado em História dos Descobrimentos e da Expansão Portuguesa apresentada à Faculdade de Letras da Universidade Clássica de Lisboa, Lisboa, 1994 (texto fotocopiado).
Bibliografia: BOXER, Charles R., Portuguese merchants and missionaries in feudal Japan. 1543-1640, Londres, Variorum Reprints, 1986. IDEM, O Grande navio de Amacau, Lisboa, Fundação Oriente e Centro de Estudos Marítimos de Macau, 1989. LEITÃO, Ana Maria Ramalho Prosérpio, Do Trato Português no Japão: Presenças que se cruzam (1543-1639), dissertação de mestrado em História dos Descobrimentos e da Expansão Portuguesa apresentada à Faculdade de Letras da Universidade Clássica de Lisboa, Lisboa, 1994 (texto fotocopiado).