Data de publicação
2009
Categorias
Período
Área Geográfica

Pedro Álvares Cabral, foi o capitão-mor da armada da Índia de 1500. Ao fundear em terras sul-americanas tornou-se no descobridor oficial do Brasil. A sua nomeação parece integrar-se numa política de D. Manuel I para aumentar a influência da Ordem de Cristo, relativamente à estrutura de comandos das armadas da Índia. Pedro Álvares pertencia a uma linhagem que servia a Ordem e a Casa de Viseu-Beja havia um século. O bisavô, Luís Álvares Cabral, fora vedor-mor de D. Henrique, 1º duque de Viseu e governador da Ordem. O avô, Fernando Álvares Cabral, morrera em Tânger, em 1437, ao defender D. Henrique. O pai, Fernão Cabral, também pertencera à Casa de Viseu e acompanhara o duque a Marrocos, em 1458; fora depois um dos fidalgos que haviam ficado a defender Alcácer-Ceguer do assédio muçulmano. Após a morte do infante D. Henrique, Fernão Cabral passara a integrar a Casa real. Era alcaide-mor de Belmonte e membro do Conselho, tendo desempenhado outros cargos relevantes na Beira em nome da Coroa.

Outro antepassado fora Gonçalo Velho Cabral, comendador de Almorol (O. Cristo), o 1º capitão das ilhas de São Miguel e Santa Maria. Por via materna, Pedro Álvares era neto de João Gouveia, fidalgo com domínios na Beira que pereceu às mãos dos mouros durante a campanha de D. Afonso V em Marrocos no início de 1464, e era sobrinho de Vasco Fernandes de Gouveia, outro magnate beirão a quem D. Afonso V viria a conceder a vila de Tetuão, após a expedição vitoriosa de 1471, e que morreu durante a invasão de Castela pelo rei português, em 1475.

Pouco se sabe sobre Pedro Álvares Cabral até 1500; sabemos que, por ser o filho segundo de Fernão Cabral e Isabel de Gouveia, assumira o apelido materno, pelo que aquando da sua nomeação para capitão-mor da armada ainda é referido como Pedro Álvares de Gouveia. Em 1484, com cerca de 15 anos, era membro da Casa Real figurando na lista dos moços fidalgos d'el-rei. Deve ter servido a Coroa nas praças africanas, e veio a beneficiar de uma tença anual de 26.000 reais que foi atribuída a ele e a seu irmão mais velho, João Fernandes Cabral, e que depois foi separada em duas tenças individuais de 13.000 reais cada uma, por decisão de D. Manuel I, em 1497. Apesar de estar ligado à Casa Real, Pedro Álvares foi admitido na Ordem de Cristo por D. Manuel, quando este era duque de Beja. Dois dos seus irmãos mais novos estavam ligados igualmente ao duque, que, a 25 de Outubro de 1495, se tornou no novo rei de Portugal. Luís Álvares Cabral integrara os efectivos da Casa de Beja em 1492 e Diogo Fernandes Cabral, em 1500, era capelão real.

Ao partir de Lisboa, em Março de 1500, Pedro Álvares levava duas missões. Em primeiro lugar proceder discretamente à busca de terras no sudoeste do Atlântico; em segundo lugar tentar estabelecer relações diplomáticas e comerciais com Calicute e realizar uma demonstração de força contra os muçulmanos que dominavam os mares da Ásia. Levava, por isso, uma armada de 13 navios: 8 navios d'el-rei destinados à Índia, dois armados por privados com o mesmo destino, duas outras embarcações que deviam ficar na costa oriental africana e mais um navio pequeno carregado de mantimentos suplementares. A cronologia desta armada da Índia de 1500 é analisada em artigo separado.

Depois de ter passado o arquipélago de Cabo Verde sem se deter e de ter perdido um navio, cujo destino nunca foi conhecido, a armada cabralina mudou de rumo e começou a navegar para Oeste e Noroeste, em águas mais a Ocidente das que haviam sido cruzadas pela armada do Gama. Foi, de facto, vogando nessa direcção (com o cabo da Boa Esperança nas costas) que a tripulação avistou o monte Pascoal e a actual baía Cabrália. Após uma escala de uma semana a armada retomou sua viagem para Oriente, à excepção do navio pequeno que foi reenviado para o reino com a notícia da descoberta. A chegada a Lisboa dos homens comandados por Gaspar de Lemos passou despercebida, o que só se compreende se a tripulação tivesse ordens estritas para não referir os sucessos da viagem e o exotismo da paisagem e das gentes encontradas; tal facto só se pode explicar por uma ordem dada pelo próprio rei, ou seus oficiais mais próximos, antes da partida da armada, pois, em regra, a chegada de um navio com a notícia de um descobrimento era rodeada de alarido e da apresentação de animais e indígenas desses lugares.

Se a primeira missão foi cumprida com sucesso, já a demanda do Oriente revelou-se bem mais difícil. Ainda antes de cruzar o cabo da Boa Esperança, a armada foi surpreendida por uma forte tempestade que provocou o naufrágio de quatro navios e o desgarramento de um outro. Reduzido a seis embarcações, Pedro Álvares confirmou as boas relações com Melinde, e depois cruzou o Mar Arábico. Inicialmente, o Samorim acolheu bem os Portugueses e concedeu-lhes um local para estabelecerem uma feitoria. No entanto, os mercadores muçulmanos conseguiram manipular o soberano indiano, ao mesmo tempo que logravam retardar o abastecimento dos navios portugueses. Entretanto, a pedido do Samorim, a armada portuguesa capturou um navio carregado de elefantes; para cumprir essa missão o capitão-mor destacou apenas a caravela de Pero de Ataíde, o navio mais pequeno da sua esquadra, pelo que o triunfo do Ataíde redundou numa manifestação de força e num crescendo de preocupações para os comerciantes muçulmanos.

A impaciência dos portugueses, que viam o tempo a passar sem que lhes fossem fornecidas as desejadas especiarias, e a intriga dos muçulmanos levaram à eclosão de vários incidentes que culminaram no ataque à feitoria portuguesa e na morte de cerca de 50 homens, incluindo o feitor, Aires Correia, e um dos escrivães, o célebre Pero Vaz de Caminha.

Depois de retaliar, bombardeando a cidade, Pedro Álvares Cabral abandonou Calicute e foi fundear em Cochim. Este reino, rival do Samorim, disponibilizou de imediato aos Portugueses as tão desejadas especiarias e nasceu então uma das mais duradouras alianças que a Coroa de Portugal estabeleceu na Índia. Antes de regressar ao reino, Cabral ainda trocou correspondência com as autoridades de Coulão e visitou Cananor. Em Cochim ficou um feitor apoiado por um pequeno contingente.

Durante o regresso, perdeu-se mais uma nau na costa oriental africana, mas as demais chegaram a salvamento ao reino entre o final de Junho e o fim de Julho de 1501. No regresso da Índia, Cabral trouxe uma boa carga de especiarias, bem como as bases da aliança com Cochim e as primeiras notícias de Sofala. Apesar das avultadas perdas humanas e materiais que a armada sofreu, D. Manuel I apreciou o desempenho de Pedro Álvares Cabral. Só assim se explica que o tenha nomeado de seguida capitão-mor da armada que haveria de partir para a Índia na Primavera de 1502. No entanto, o monarca atribuiu, ao mesmo tempo, um comando autónomo a Vicente Sodré, também cavaleiro da Ordem de Cristo, destinado especificamente ao bloqueio do Mar Vermelho. Desagradado, Cabral terá provocado um incidente ao manifestar a sua oposição à existência de um comando autónomo no Índico. Terá sido esse incidente que levou o rei a confiar o comando da armada de 1502 a Vasco da Gama, então cavaleiro da Ordem de Santiago. Ao contrário dos outros comandos sobreviventes da sua armada, Cabral não voltou a servir a Coroa, embora em 1502 tenha casado com D. Isabel de Castro da linhagem dos Noronhas e sobrinha de Afonso de Albuquerque. D. Manuel I terá ficado muito insatisfeito com o incidente político provocado por Cabral, pois nunca mais recorreu aos seus serviços. Pedro Álvares Cabral faleceu em 1520, tendo sido sepultado na Igreja da Graça, em Santarém.

Bibliografia:
COSTA, João Paulo Oliveira e, "A armada de Pedro Álvares Cabral. Significado e protagonistas" in Os Descobridores do Brasil. Exploradores do Atlântico e construtores do Estado da Índia, Lisboa, 2000, pp. 11-70. Idem, D. Manuel I, um Príncipe do Renascimento, Lisboa, Temas & Debates, 2007. COUTO, Jorge, A construção do Brasil, Lisboa, Edições Cosmos, 1995. FONSECA, Luís Adão da, Pedro Álvares Cabral. Uma viagem, Lisboa, Edições Inapa, 1999. SAMPAYO, Luís de Mello Vaz de, Subsídios para uma biografia de Pedro Álvares Cabral, Coimbra, 1971.