Data de publicação
2009
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Área Geográfica
A presença muçulmana em Espanha a partir do início do século VIII fomentou, por todo o território, a produção de têxteis de diversos tipos e a ascensão de uma indústria vigorosa de produção de tapetes. As primeiras referências, que ocorrem num poema em latim do século XI e numa obra geográfica árabe do século XII, mencionam os tapetes de Chinchilla e Cuenca na província de Múrcia, que, segundo os autores, seriam exportados para todos os países. Apesar do controlo árabe de Espanha ter sido reduzido à região em torno de Granada, pelo século XIII, os muçulmanos (mudéjares) que permaneceram no Sudeste recristianizado mantiveram a tradição da produção de tapetes. Em Múrcia, vários grandes centros de tecelagem tornaram-se famosos (Letur, Leitor, e Alcarz), e esta indústria parece ter atingido o seu auge durante o século XV, com a produção de grandes e ricos tapetes para mecenas cristãos. Com efeito, as encomendas feitas pela coroa e pela nobreza de Aragão poderão ter sido responsáveis pelo renascimento daquela arte.

Os tapetes espanhóis conheceram grande circulação no seio da Europa. Em Portugal, eram muitíssimo apreciados, sendo registados desde, pelo menos, o século XIII, nos inventários e contas do rei D. Dinis (r. 1279-1325). A sua presença em número tão significativo é confirmada por fontes históricas até meados do século XVI, sendo ainda referidos ocasionalmente em documentos posteriores. Embora não tenham sobrevivido até aos nossos dias exemplares em Portugal, os padrões e as cores destas valorizadas importações podem ser contemplados em representações pictóricas. Surgem, primeiramente, em pinturas portuguesas datadas do início do século XVI, sendo três grandes tipos representados: os que apresentam padrões de "estrela e octógono", as cópias locais dos importados estilos clássicos "turcos" e os tapetes com padrões renascentistas mais europeizados.

Os tapetes espanhóis do primeiro tipo representados na arte portuguesa inspiram-se nas tradições artísticas locais (incluindo a islâmica) e evidenciam frequentemente brasões de famílias reais ou nobres de Castela, permitindo-nos datá-los do segundo e terceiro quartéis do século XV. Contudo, o facto de os encontrarmos na arte portuguesa até à década de 1530 sugere que estes tapetes terão tido uma vida mais longa do que se pensava anteriormente. Apresentam, tipicamente, desenhos de campo repetitivos, nos quais filas de motivos geométricos de pequena escala (octógonos, hexágonos e losangos) formam uma rede, delimitada por largas molduras com desenhos baseados na escrita cúfica (um tipo angular de caligrafia árabe). Surgem quase exclusivamente em representações da Anunciação, da Missa de São Gregório e da Apresentação no Templo, por artistas como Francisco Henriques (Casa dos Patudos, Alpiarça) e Gregório Lopes (Museu Nacional de Arte Antiga, Lisboa). A inclusão da caligrafia árabe nestas cenas não entra em conflito com o seu conteúdo cristão, e reflecte a grande estima dada à palavra escrita, conferindo dignidade e prestígio à Virgem e aos santos ali figurados.

O segundo tipo de tapete espanhol é composto por diversas combinações de padrões vistos em tapetes turcos contemporâneos, importados para a Europa a partir de meados do século XV. Comummente, os tecelões mudéjares espanhóis imitavam os padrões de campo e as cores garridas dos turcos originais, mas usavam desenhos locais para as molduras. Também o uso do 'nó de teia única' distingue os exemplares espanhóis dos seus correspondentes turcos. O padrão mais popular é baseado nos tapetes turcos de "grande padrão de Holbein" em que a unidade principal do padrão é uma estrela inscrita num octógono, delimitado por um quadrado. Pelo menos três versões destes padrões de "rodas" (como se chamavam então) foram produzidas em Espanha, o que sugere que o desenho além de apreciado, seriam igualmente económico, ao passo que a insistência nos padrões da bordadura com desenhos indígenas evoca uma indústria com uma forte identidade regional, que não se deixa ameaçar pelas importações estrangeiras. Muitos destes exemplares "de rodas" chegaram aos dias de hoje, com tamanhos que variam de uma passadeira com uma coluna de três quadrados até um tapete com seis filas de três compartimentos. Estes tapetes encontram-se bem representados nas colecções da coroa e nobreza portuguesa e são figurados em vários quadros seiscentistas, a partir da década de trinta, incluindo, para além do reportório habitual, um quadro do Pentecostes (Ermida da Nossa Senhora dos Remédios, Alfama, Lisboa).

O terceiro tipo de tapetes espanhóis reflecte a acentuada alteração nos gostos que ocorreu com a queda do reino muçulmano de Granada e com a expulsão inicial dos muçulmanos (e judeus) de Espanha, no ano de 1492. Os grandes octógonos do padrão "Holbein" transformam-se em coroas renascentistas, enquanto os desenhos cruzados geométricos são preteridos em favor de desenhos repetidos baseados nas representações góticas e renascentistas da natureza. Estes tapetes muito raramente surgem na arte portuguesa (e.g. Gregório Lopes, Apariçao de Cristo à Virgem, c. 1540, Museu de Setúbal), mas a sua ausência relativa não deverá ser interpretada como indício de uma quebra no interesse nos tapetes islâmicos ou de uma alteração na atitude para com estes. Pelo contrário, ela reflecte uma alteração positiva no comércio e no gosto que ocorreu com a expansão económica e dos horizontes de Portugal no início do século XVI, e com a chegada de outros tipos de tapetes orientais de terras mais remotas.

Bibliografia:
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