Data de publicação
2009
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Situada na África Oriental, a capitania portuguesa de Moçambique distribuiu-se, na sua máxima extensão, entre a baía de Lourenço Marques, a sul, e usualmente Cabo Delgado, a norte, tendo como ponto mais interior o Zumbo. Até ao final do séc. XVIII, a presença portuguesa centrou-se em vários lugares do litoral e numa extensa área ao longo do rio Zambeze.
Ao iniciar-se a centúria de Quinhentos, o interesse português dirigiu-se para Sofala, o extremo sul da região suaíli onde desembocava a rota que, procedente do planalto karanga (Monomotapa, Manica e Quiteve), escoava o ouro indispensável para obter as especiarias indianas. Em 1505, foi fundada aí uma feitoria e fortaleza, seguindo-se, em 1507, idêntica iniciativa na Ilha de Moçambique, dotada de um óptimo porto. Na ilha, eram armazenados os panos destinados a Sofala e as naus da carreira da Índia faziam aí escala. Instituída logo em 1505, a capitania de Sofala ficou integrada no Estado da Índia. A partir dos anos de 1530, os nomeados para a capitania residiam por longos períodos na ilha, que se afirmou como o principal centro administrativo e passou a integrar o título dos capitães, depois designados de Moçambique.
O projecto da coroa portuguesa consistiu em impor o monopólio da feitoria de Sofala nas trocas dos tecidos e contas indianos pelo ouro, deixando as rotas para o interior aos africanos e muçulmanos. Para tal, ensaiou o bloqueio das vias marítimas por uma armada estacionada em Melinde. Mas, a construção do monopólio régio deparou com a resistência dos mercadores islâmicos de Sofala e com vários concorrentes, incluindo os funcionários régios e os portugueses dispersos pelo sertão. Acresce que, pouco antes da entrada dos portugueses no Índico, a deslocação do Monomotapa para o norte do planalto promovera um novo itinerário que conduzia o ouro pelo Zambeze para um conjunto de enseadas com centro em Angoche. À tentativa falhada de eliminar este porto suaíli (1511), sucederam-se viagens de exploração do sertão e medidas para vigiar o tráfico no delta. Em 1530, pelos novos Regimentos de Sofala, a coroa ensaiou consolidar o monopólio sobre o trato do ouro e alargá-lo ao marfim. Foi reforçado o controlo do mar com embarcações que actuavam entre Moçambique e Sofala.
Nos anos de 1540, já os capitães de Sofala tinham no delta do Zambeze um feitor para negociar marfim, um artigo com importância crescente no comércio com a Índia. A actividade de mercadores privados ao longo do rio conduziu à fundação de povoações portuguesas em Quelimane, o principal porto no delta, Sena e Tete. Nestes lugares, as mercadorias eram vendidas aos negociantes cristãos e muçulmanos, que as dirigiam para as feiras, sendo as principais a de Massapa, no Monomotapa, e a de Chipangura, em Manica. Além de dominarem as trocas oceânicas, os portugueses inseriram-se nas redes intra-africanas, negociando panos de fabrico local, mas declinaram a exploração das minas de ouro oferecidas pelo mutapa (imperador). Por fim, o monopólio régio foi estendido a todo o comércio feito na região do Zambeze, os Rios de Cuama (Rios de Sena), por um regimento de 1564.
O aumento da actividade particular nas trocas internacionais, associado à procura do marfim, foi acompanhado pela dispersão dos pontos de comércio e originou expedições de reconhecimento do litoral. Para sul, os portugueses frequentavam a costa de Inhambane e a baía de Lourenço Marques (anos de 1540). No norte, negociavam nas ilhas Quirimba (então, Maluane), onde acabaram por se estabelecer. Também reforçaram a sua presença na Ilha de Moçambique, erigindo povoações na Terra Firme, em Mossuril, Cabaceira Grande e Cabaceira Pequena.
A par da exploração costeira, sucederam-se programas de territorialização da presença portuguesa nos Rios de Cuama, com a nomeação de governadores-conquistadores e o envio de expedições militares. A primeira chegou ao Índico em 1570, comandada por Francisco Barreto, capitão-mor da "empresa do senhorio do Monomotapa", com jurisdição sobre o território entre Sofala e Melinde. A jornada tinha como causa próxima a morte do jesuíta D. Gonçalo da Silveira (1561), ditada pelo mutapa, mas subjazia-lhe o intuito de conquistar as minas do Monomotapa e de Manica. Arredados os fins militares, a expedição instalou fortes em Sena e Tete e estendeu a administração régia ao vale do Zambeze, até então entregue aos mercadores. As notícias sobre a descoberta de prata na Chicova e de tratados com o Monomotapa (1607 e 1629) suscitaram novos projectos de ocupação. Foram nomeados governadores que actuaram sobretudo nos Rios de Cuama, deixando castelões em Moçambique. Gorada a exploração régia das minas, os portugueses espalharam-se pelo planalto a sul do Zambeze, onde fundaram feiras, até que foram expulsos por Butua, nos anos de 1690, e se dirigiram para o território a norte do rio. Os missionários acompanharam este processo, quer baptizando os mutapa e outros chefes, quer mantendo igrejas nas feiras (dominicanos) e nas povoações do vale (dominicanos e jesuítas). A expansão territorial conduziu ao domínio de vastas áreas nos Rios de Cuama, cedidas como prazos da coroa. Estas terras foram a base do poder dos proeminentes senhores dos prazos, a elite da capitania recrutada em Portugal, na Índia e na região, a qual teve nas donas mestiças o seu principal símbolo.
Durante este período, o comércio de Moçambique afirmou-se como o mais relevante para o Estado da Índia. Perante dificuldades financeiras crescentes, c. 1595, o monopólio do comércio foi arrendado aos capitães. O contrato respeitava à área dos Rios de Cuama, que incluía os portos vedados a sul da Ilha de Moçambique e tinha como principal eixo de penetração no sertão o Zambeze, por onde corria a maior parte do trato. O regime de monopólio, com distintas formas de administração e interrompido por breves períodos de liberdade, subsistiu até meados do séc. XVIII. Os moradores da Ilha de Moçambique tinham garantido o comércio livre com o litoral fronteiro e a norte da ilha e as ilhas do Índico (S. Lourenço e Comores).
Entretanto, também os abastecimentos externos foram alvo de mudança. Em 1686, a Companhia dos Mazanes de Diu obteve o exclusivo da viagem entre este porto, o principal fornecedor de têxteis, e Moçambique. Em breve, os mercadores baneanes originários daquela praça dominaram o comércio na Ilha de Moçambique e no litoral para c. 1771 se expandirem para os Rios de Sena.
A disputa pela África Oriental por vários poderes marítimos introduziu novas dinâmicas no domínio português da região. O avanço turco no Índico levou à construção, decidida nos anos de 1540, da nova fortaleza de S. Sebastião na Ilha de Moçambique. A expansão omanita ameaçou a capitania, na segunda metade do séc. XVII. O ataque à ilha, em 1669, concorreu para a decisão da coroa de reforçar a defesa de Moçambique, enviando casais e fazendo deslocar para aí o vice-rei da Índia em 1678. Desde a viragem para o séc. XVII, potências europeias, em particular os holandeses e ingleses, ensaiaram apoderar-se das posições portuguesas. A situação mais crítica ocorreu com os cercos holandeses (1607 e 1608), mas a Ilha de Moçambique, com a nova fortaleza, foi eficazmente defendida. Porém, os holandeses persistiram em atingir as regiões auríferas, mesmo após fundarem uma colónia no Cabo (1652). Entre 1721 e 1730, mantiveram uma feitoria em Lourenço Marques, donde enviavam um barco a Inhambane. Em resposta, os portugueses fundaram uma povoação neste local, c. 1722.
No meio da incapacidade do Estado da Índia para garantir a defesa e dinamizar o comércio de Moçambique, a coroa, por decreto de 19 de Abril de 1752, colocou a capitania na dependência directa de Lisboa, nomeando seu governador Francisco de Melo e Castro, já então no cargo. O Conselho da Fazenda da Índia continuou a administrar o monopólio do comércio, extinto apenas por alvará de 1755. Esse diploma decretou a liberdade mercantil para os súbditos do Estado da Índia, depois alargada a todos os negociantes do império, por lei de 1761.
As Instruções de 1761 e outros diplomas coevos, aplicados a partir de 1763, definiram novas orientações políticas, inspiradas na legislação para as capitanias do Brasil. Na sequência dessas instruções, foi modernizada a administração com a instituição da secretaria do governo, da Junta do Crime e da Provedoria, esta substituída, em 1787, pela Junta da Fazenda. A administração municipal foi estendida à capitania, onde as Misericórdias da ilha e de Sena haviam cumprido várias das suas atribuições. Em 1763, foi criada a câmara da Ilha de Moçambique e, até ao ano seguinte, o mesmo sucedeu no Ibo, Quelimane, Sena, Tete, Zumbo, Sofala e Inhambane, povoações então elevadas a vilas.
A liberdade de comércio, aliada ao exclusivo das ligações com os portos subalternos, garantida em 1761, permitiu o crescimento da elite mercantil da Ilha de Moçambique, que beneficiou ainda da expansão do tráfico de escravos. Apesar de proibida pela coroa, a intervenção dos franceses nos circuitos esclavagistas, para abastecer as ilhas de Bourbon e de França, deu uma nova dimensão ao tráfico. As exportações cresceram após 1770 e, sobretudo, 1789, quando, para conter o desvio dos escravos levados pelos yao para Quíloa, o comércio francês foi autorizado por António de Melo e Castro, conforme ordens secretas da coroa. A esta rota juntou-se a que fornecia a América e o Cabo da Boa Esperança. Na década de 1790, a exportação para o Brasil adquiriu relevância e prolongou-se para lá do fim do tráfico legal, intensificando a sangria de pessoas da África Oriental.
As últimas décadas do século foram também de expansão para sul, em resposta à concorrência de ingleses e austríacos. Em 1778, a Companhia de Comércio Austríaca instalou-se em Lourenço Marques, donde foi expulsa em 1781. Foi, então, instalado aí um presídio, para onde foi transferida a capital da moderna colónia de Moçambique, no final do séc. XIX, num novo contexto de disputa anglo-portuguesa pela região.
Bibliografia:
ANTUNES, Luís Frederico Dias, O bazar e a fortaleza em Moçambique. A comunidade baneane do Guzerate e a transformação do comércio afro-asiático (1686-1810), Universidade Nova de Lisboa, Dissertação de doutoramento, 2001. AXELSON, Eric, Portuguese in South-East Africa 1488-1600, Cape Town, C. Struik, 1973. CAPELA, José, O tráfico de escravos nos portos de Moçambique, 1733-1904, Porto, Afrontamento, 2002. LOBATO, Alexandre, História do Presídio de Lourenço Marques, Lisboa, 1949. NEWITT, Malyn, A history of Mozambique, London, Hurst & Company, 1995. RODRIGUES, Eugénia, Portugueses e Africanos nos Rios de Sena. Os prazos da Coroa nos séculos XVII e XVIII, Universidade Nova de Lisboa, Dissertação de Doutoramento, 2002.
Ao iniciar-se a centúria de Quinhentos, o interesse português dirigiu-se para Sofala, o extremo sul da região suaíli onde desembocava a rota que, procedente do planalto karanga (Monomotapa, Manica e Quiteve), escoava o ouro indispensável para obter as especiarias indianas. Em 1505, foi fundada aí uma feitoria e fortaleza, seguindo-se, em 1507, idêntica iniciativa na Ilha de Moçambique, dotada de um óptimo porto. Na ilha, eram armazenados os panos destinados a Sofala e as naus da carreira da Índia faziam aí escala. Instituída logo em 1505, a capitania de Sofala ficou integrada no Estado da Índia. A partir dos anos de 1530, os nomeados para a capitania residiam por longos períodos na ilha, que se afirmou como o principal centro administrativo e passou a integrar o título dos capitães, depois designados de Moçambique.
O projecto da coroa portuguesa consistiu em impor o monopólio da feitoria de Sofala nas trocas dos tecidos e contas indianos pelo ouro, deixando as rotas para o interior aos africanos e muçulmanos. Para tal, ensaiou o bloqueio das vias marítimas por uma armada estacionada em Melinde. Mas, a construção do monopólio régio deparou com a resistência dos mercadores islâmicos de Sofala e com vários concorrentes, incluindo os funcionários régios e os portugueses dispersos pelo sertão. Acresce que, pouco antes da entrada dos portugueses no Índico, a deslocação do Monomotapa para o norte do planalto promovera um novo itinerário que conduzia o ouro pelo Zambeze para um conjunto de enseadas com centro em Angoche. À tentativa falhada de eliminar este porto suaíli (1511), sucederam-se viagens de exploração do sertão e medidas para vigiar o tráfico no delta. Em 1530, pelos novos Regimentos de Sofala, a coroa ensaiou consolidar o monopólio sobre o trato do ouro e alargá-lo ao marfim. Foi reforçado o controlo do mar com embarcações que actuavam entre Moçambique e Sofala.
Nos anos de 1540, já os capitães de Sofala tinham no delta do Zambeze um feitor para negociar marfim, um artigo com importância crescente no comércio com a Índia. A actividade de mercadores privados ao longo do rio conduziu à fundação de povoações portuguesas em Quelimane, o principal porto no delta, Sena e Tete. Nestes lugares, as mercadorias eram vendidas aos negociantes cristãos e muçulmanos, que as dirigiam para as feiras, sendo as principais a de Massapa, no Monomotapa, e a de Chipangura, em Manica. Além de dominarem as trocas oceânicas, os portugueses inseriram-se nas redes intra-africanas, negociando panos de fabrico local, mas declinaram a exploração das minas de ouro oferecidas pelo mutapa (imperador). Por fim, o monopólio régio foi estendido a todo o comércio feito na região do Zambeze, os Rios de Cuama (Rios de Sena), por um regimento de 1564.
O aumento da actividade particular nas trocas internacionais, associado à procura do marfim, foi acompanhado pela dispersão dos pontos de comércio e originou expedições de reconhecimento do litoral. Para sul, os portugueses frequentavam a costa de Inhambane e a baía de Lourenço Marques (anos de 1540). No norte, negociavam nas ilhas Quirimba (então, Maluane), onde acabaram por se estabelecer. Também reforçaram a sua presença na Ilha de Moçambique, erigindo povoações na Terra Firme, em Mossuril, Cabaceira Grande e Cabaceira Pequena.
A par da exploração costeira, sucederam-se programas de territorialização da presença portuguesa nos Rios de Cuama, com a nomeação de governadores-conquistadores e o envio de expedições militares. A primeira chegou ao Índico em 1570, comandada por Francisco Barreto, capitão-mor da "empresa do senhorio do Monomotapa", com jurisdição sobre o território entre Sofala e Melinde. A jornada tinha como causa próxima a morte do jesuíta D. Gonçalo da Silveira (1561), ditada pelo mutapa, mas subjazia-lhe o intuito de conquistar as minas do Monomotapa e de Manica. Arredados os fins militares, a expedição instalou fortes em Sena e Tete e estendeu a administração régia ao vale do Zambeze, até então entregue aos mercadores. As notícias sobre a descoberta de prata na Chicova e de tratados com o Monomotapa (1607 e 1629) suscitaram novos projectos de ocupação. Foram nomeados governadores que actuaram sobretudo nos Rios de Cuama, deixando castelões em Moçambique. Gorada a exploração régia das minas, os portugueses espalharam-se pelo planalto a sul do Zambeze, onde fundaram feiras, até que foram expulsos por Butua, nos anos de 1690, e se dirigiram para o território a norte do rio. Os missionários acompanharam este processo, quer baptizando os mutapa e outros chefes, quer mantendo igrejas nas feiras (dominicanos) e nas povoações do vale (dominicanos e jesuítas). A expansão territorial conduziu ao domínio de vastas áreas nos Rios de Cuama, cedidas como prazos da coroa. Estas terras foram a base do poder dos proeminentes senhores dos prazos, a elite da capitania recrutada em Portugal, na Índia e na região, a qual teve nas donas mestiças o seu principal símbolo.
Durante este período, o comércio de Moçambique afirmou-se como o mais relevante para o Estado da Índia. Perante dificuldades financeiras crescentes, c. 1595, o monopólio do comércio foi arrendado aos capitães. O contrato respeitava à área dos Rios de Cuama, que incluía os portos vedados a sul da Ilha de Moçambique e tinha como principal eixo de penetração no sertão o Zambeze, por onde corria a maior parte do trato. O regime de monopólio, com distintas formas de administração e interrompido por breves períodos de liberdade, subsistiu até meados do séc. XVIII. Os moradores da Ilha de Moçambique tinham garantido o comércio livre com o litoral fronteiro e a norte da ilha e as ilhas do Índico (S. Lourenço e Comores).
Entretanto, também os abastecimentos externos foram alvo de mudança. Em 1686, a Companhia dos Mazanes de Diu obteve o exclusivo da viagem entre este porto, o principal fornecedor de têxteis, e Moçambique. Em breve, os mercadores baneanes originários daquela praça dominaram o comércio na Ilha de Moçambique e no litoral para c. 1771 se expandirem para os Rios de Sena.
A disputa pela África Oriental por vários poderes marítimos introduziu novas dinâmicas no domínio português da região. O avanço turco no Índico levou à construção, decidida nos anos de 1540, da nova fortaleza de S. Sebastião na Ilha de Moçambique. A expansão omanita ameaçou a capitania, na segunda metade do séc. XVII. O ataque à ilha, em 1669, concorreu para a decisão da coroa de reforçar a defesa de Moçambique, enviando casais e fazendo deslocar para aí o vice-rei da Índia em 1678. Desde a viragem para o séc. XVII, potências europeias, em particular os holandeses e ingleses, ensaiaram apoderar-se das posições portuguesas. A situação mais crítica ocorreu com os cercos holandeses (1607 e 1608), mas a Ilha de Moçambique, com a nova fortaleza, foi eficazmente defendida. Porém, os holandeses persistiram em atingir as regiões auríferas, mesmo após fundarem uma colónia no Cabo (1652). Entre 1721 e 1730, mantiveram uma feitoria em Lourenço Marques, donde enviavam um barco a Inhambane. Em resposta, os portugueses fundaram uma povoação neste local, c. 1722.
No meio da incapacidade do Estado da Índia para garantir a defesa e dinamizar o comércio de Moçambique, a coroa, por decreto de 19 de Abril de 1752, colocou a capitania na dependência directa de Lisboa, nomeando seu governador Francisco de Melo e Castro, já então no cargo. O Conselho da Fazenda da Índia continuou a administrar o monopólio do comércio, extinto apenas por alvará de 1755. Esse diploma decretou a liberdade mercantil para os súbditos do Estado da Índia, depois alargada a todos os negociantes do império, por lei de 1761.
As Instruções de 1761 e outros diplomas coevos, aplicados a partir de 1763, definiram novas orientações políticas, inspiradas na legislação para as capitanias do Brasil. Na sequência dessas instruções, foi modernizada a administração com a instituição da secretaria do governo, da Junta do Crime e da Provedoria, esta substituída, em 1787, pela Junta da Fazenda. A administração municipal foi estendida à capitania, onde as Misericórdias da ilha e de Sena haviam cumprido várias das suas atribuições. Em 1763, foi criada a câmara da Ilha de Moçambique e, até ao ano seguinte, o mesmo sucedeu no Ibo, Quelimane, Sena, Tete, Zumbo, Sofala e Inhambane, povoações então elevadas a vilas.
A liberdade de comércio, aliada ao exclusivo das ligações com os portos subalternos, garantida em 1761, permitiu o crescimento da elite mercantil da Ilha de Moçambique, que beneficiou ainda da expansão do tráfico de escravos. Apesar de proibida pela coroa, a intervenção dos franceses nos circuitos esclavagistas, para abastecer as ilhas de Bourbon e de França, deu uma nova dimensão ao tráfico. As exportações cresceram após 1770 e, sobretudo, 1789, quando, para conter o desvio dos escravos levados pelos yao para Quíloa, o comércio francês foi autorizado por António de Melo e Castro, conforme ordens secretas da coroa. A esta rota juntou-se a que fornecia a América e o Cabo da Boa Esperança. Na década de 1790, a exportação para o Brasil adquiriu relevância e prolongou-se para lá do fim do tráfico legal, intensificando a sangria de pessoas da África Oriental.
As últimas décadas do século foram também de expansão para sul, em resposta à concorrência de ingleses e austríacos. Em 1778, a Companhia de Comércio Austríaca instalou-se em Lourenço Marques, donde foi expulsa em 1781. Foi, então, instalado aí um presídio, para onde foi transferida a capital da moderna colónia de Moçambique, no final do séc. XIX, num novo contexto de disputa anglo-portuguesa pela região.
Bibliografia:
ANTUNES, Luís Frederico Dias, O bazar e a fortaleza em Moçambique. A comunidade baneane do Guzerate e a transformação do comércio afro-asiático (1686-1810), Universidade Nova de Lisboa, Dissertação de doutoramento, 2001. AXELSON, Eric, Portuguese in South-East Africa 1488-1600, Cape Town, C. Struik, 1973. CAPELA, José, O tráfico de escravos nos portos de Moçambique, 1733-1904, Porto, Afrontamento, 2002. LOBATO, Alexandre, História do Presídio de Lourenço Marques, Lisboa, 1949. NEWITT, Malyn, A history of Mozambique, London, Hurst & Company, 1995. RODRIGUES, Eugénia, Portugueses e Africanos nos Rios de Sena. Os prazos da Coroa nos séculos XVII e XVIII, Universidade Nova de Lisboa, Dissertação de Doutoramento, 2002.
Autoria da imagem
Eugénia Rodrigues